Não é novidade a entrada meteórica das tecnologias ligadas à Inteligência Artificial (IA) e à robótica na economia e na sociedade. A IA entrou em força na forma como a atividade produtiva se organiza e se desenvolve, na forma como as decisões são tomadas e nos nossos comportamentos, sendo patente em muitas áreas, de que são exemplos a saúde, o direito, o sector financeiro, os transportes, as telecomunicações, a indústria, os smartphones e apresentando um potencial de crescimento numas quantas outras, nomeadamente, no sector alimentar, na indústria farmacêutica, ou na metalurgia.

Concretizemos alguns destes exemplos. O grande volume de dados disponíveis e a sua análise, através de tecnologias que utilizam a IA, terá um forte impacto na área da saúde, ao permitir novas soluções terapêuticas, ao auxiliar nos diagnósticos, ao ajudar na descoberta de novos tratamentos médicos, ao monitorar pacientes com determinadas doenças, etc. Na área do direito, as implicações da adoção da IA são também antecipáveis. A IA auxiliará na análise e na elaboração dos contratos através do reconhecimento da linguagem utilizada, bem como na análise de julgamentos e sentenças anteriores.

Uma proporção muito significativa das empresas do setor financeiro, incorporam a IA em áreas como a dos clientes, permitindo uma avaliação mais precisa, que pode, por exemplo, classificar como bons clientes, aqueles que a análise humana não identificaria como tal, propiciando a expansão do negócio, através da realização de operações financeiras que de outra forma não aconteceriam. E esta tendência tenderá a aprofundar-se.

Na indústria, a utilização da IA e o processo de automação em diversas fases da cadeia de produção irão intensificar-se. E isto está já bem patente no forte aumento verificado, nesta última década, na utilização de robots industriais e no facto do número de patentes ligadas à IA, ter crescido, em média, 6% ao ano, entre 2010 e 2015, conforme referem as estatísticas da OCDE.

A difusão da inovação tecnológica no domínio da IA e das tecnologias de machine learning, provocará a renovação de alguns sectores de atividade e a criação de outros, aumentará a oferta de produtos e serviços de maior qualidade, criará novos mercados e impulsionará a procura, criando novas fontes de rendimento e estimulando o crescimento económico.

A IA terá efeito nas estratégias de marketing, nas vendas, na gestão das cadeias de oferta, na logística, etc. As empresas que estiverem na dianteira na adoção destas tecnologias poderão ter ganhos significativos de quota de mercado, face aos seus concorrentes, sendo, por isso, de prever que nelas se concentre de forma desproporcional a riqueza gerada.

A incorporação das tecnologias da IA no processo produtivo de bens e serviços, antecipam consequências muito significativas no mercado de trabalho. Um dos impactos mais importantes será o aumento da produtividade, por via de uma maior eficiência na utilização do fator trabalho. A Accenture, por exemplo, numa análise aplicada a uma dúzia de economias, estima que estas dupliquem o seu crescimento em 2035 e que os ganhos de eficiência associados ao fator trabalho rondarão os 40%. A PwC refere que o crescimento da economia global pode cifrar-se em 14% em 2030 e a McKinsey estima que 70% das empresas adotarão, pelo menos, um tipo de tecnologia de IA.

No mercado de trabalho, as transformações que se perspetivam são de grande significado. Haverá criação, requalificação e destruição de emprego. Os trabalhadores de baixa e média qualificação, que desempenham funções passíveis de serem automatizadas, serão substituídos por robôs virtuais, que serão capazes de resolver problemas e de aprenderem sozinhos, à medida que processam mais e mais dados.

As pessoas serão libertadas para exercerem atividades mais criativas e de maior valor acrescentado, se forem capazes de se adaptar. Funções novas surgirão, associadas à necessidade de conceção e implementação de tecnologias que utilizam a IA. Quem não se adaptar, ou não tiver competências para tal, poderá ver-se excluído do mercado de trabalho.

O think tank Bruegel estima que 54% dos empregos na União Europeia podem estar em risco, nos próximos 20 anos. Sairão beneficiados os trabalhadores mais qualificados, capazes de serem criativos e inovadores. Aumentará a procura de trabalhadores altamente qualificados, mais produtivos e capazes de realizar tarefas mais sofisticadas. A diferença de valor acrescentado entre estes trabalhadores criativos e os de baixa e média qualificação acentuar-se-á e os salários tenderão a traduzir essas diferenças, aumentando a assimetria na distribuição do rendimento.

Estas assimetrias irão manifestar-se também entre os países que estão na vanguarda da utilização da IA e aqueles que não estão. Os dados sobre as patentes registadas revelam um forte domínio dos países asiáticos e dos EUA, conferindo-lhes benefícios económicos substanciais. Os decisores políticos serão determinantes na forma como os países encaram e aproveitam a economia da IA no futuro. Aproveitar as oportunidades que a IA gera para a economia, dará vantagens competitivas a quem o fizer. Deste ponto de vista, estas tecnologias podem aprofundar o gap entre os países mais e menos desenvolvidos, sendo que, estes últimos, pelas suas especificidades, terão maior dificuldade em entrar neste comboio de alta velocidade.

Em suma, se podemos ter certezas de que a IA terá impactos muito positivos no crescimento económico, na produtividade, e no aumento da riqueza, também é expectável que a riqueza gerada tenderá a ser concentrada, quer nas empresas e nos países que tomam a dianteira na adoção destas tecnologias, quer nos trabalhadores mais qualificados, acentuando as assimetrias na distribuição do rendimento. O desemprego gerado pela adoção da IA, não obstante a criação de novas funções, poderá atingir níveis indesejáveis.

Tudo dependerá, por um lado, de se conseguir compatibilizar o ritmo acelerado da utilização de tecnologias IA e a velocidade de adaptação do fator trabalho e, por outro lado, da implementação de políticas públicas reparadoras destas desigualdades.