O verão acabou no hemisfério norte, mas a temperatura política está agora a subir. Aproximam-se a passos largos as eleições presidenciais americanas de 3 de novembro, nas quais os eleitores decidirão quem irá liderar o país nos próximos quatro anos e também quem os representará no Senado e no Congresso.

A campanha eleitoral tem sido feroz de ambos os lados, com o auge da rivalidade a ser atingido durante o primeiro debate televisivo entre os dois candidatos presidenciais, Joe Biden e Donald Trump, que, apesar de ter testado positivo para o Covid-19, não pensa em deixar a corrida.

Está demasiado em jogo nestas eleições: Biden e Trump têm personalidades absolutamente divergentes e propõem medidas muito distintas, estando a competir para determinar o futuro, não só dos EUA, mas, em certa medida, do resto do mundo também. Entre os vários domínios da esfera pública que poderão ser impactados em função de quem sair vitorioso, espera-se que os mercados financeiros sejam os primeiros a reagir.

A incerteza em torno do desfecho das eleições, e especificamente da possibilidade de Biden vencer com uma margem reduzida, tem influenciado o comportamento dos investidores. Desde o início de setembro e até muito recentemente, o cenário de um resultado contestado parecia ser o mais provável para muitos investidores, que o descontaram nos mercados, e, ao fazê-lo, desencadearam uma correção (queda) nas principais bolsas de valores.

Paralelamente a esta correção dos preços das ações, verificou-se um aumento na procura por ativos de refúgio, como títulos do tesouro, causando uma diminuição dos rendimentos que estes geram, o que acabou por estancar o tombo das ações ao reacender o apetite pelo risco. Foi graças a este ciclo que se evitou um colapso mais pronunciado dos preços das ações.

No entanto, com o aproximar das eleições, Biden está a emergir de forma mais clara como possível vencedor, com os democratas a aparecerem também bem posicionados para ganhar no Senado e no Congresso. Se tal se concretizasse, a transição de poder aconteceria de modo mais tranquilo, o que seria benéfico para o país, tanto a nível social como económico. Porém, será que os mercados também encarariam este desenrolar dos acontecimentos como positivo? Possivelmente não, pelo menos, não inicialmente.

Biden já declarou a sua intenção de aumentar os impostos sobre os ganhos de capital e é expectável que também aumente os impostos corporativos, sendo que pretende igualmente investir particular atenção na regulação dos gigantes do setor da tecnologia; ao contrário de Trump, que promete cortar ainda mais os impostos e não é grande fã de regulação.

Assim, o êxito dos democratas tem potencial para desencadear uma liquidação das ações. Muitos investidores estarão inclinados para fechar posições a tempo de colher os lucros sem pagar impostos adicionais. Simultaneamente, os receios perante um ambiente regulatório mais rígido que poderia afetar o setor da tecnologia, o motor do rally vivido nos mercados este ano, também deverá gerar pressão de venda.

Embora uma vitória inequívoca para um dos candidatos seja, em muitos aspetos, o desenlace mais desejável para estas eleições, muitos investidores poderão não partilhar dessa visão (a menos que o vencedor seja Trump, é claro). Muito se tem falado sobre a disparidade entre Wall Street e a economia real. Ora, este é só mais um exemplo da lógica contraintuitiva que, por vezes, sustenta as expectativas dos mercados.