A esquerda gosta dos pobres porque tradicionalmente estes votam na esquerda. Vai daí, quando está no poder, toma medidas para criar mais pobres.

E para não destoar, os candidatos a líderes têm que se posicionar numa situação de empatia com os pobres. Mostrar que têm origens humildes. Foi o que Pedro Nuno Santos despudoradamente fez no seu discurso de candidatura a secretário-geral do PS. O meu avô foi sapateiro e sei bem o que os pobres sofrem. Esqueceu-se hipocritamente de dizer que o pai era empresário de sucesso e que circulava em Maseratis e Porsches.

Pedro Nuno Santos é um político profissional, sem curriculum profissional, e, como o próprio confessou, com um percurso com erros e cicatrizes. Há 12 anos o jovem Pedro Nuno Santos propunha não pagar a dívida pública e que, segundo ele, poria os credores alemães e franceses com as pernas a tremer. Colaborou com o primeiro-ministro na tomada do “controlo” da TAP em que os privados ficavam com a gestão executiva, o que revela bem a falta de preparação neste tipo de transacções de empresas.

Foi o autor moral da intervenção do Estado na TAP, que implicou assumir a dívida e os riscos de uma empresa insolvente, pagar ao investidor estrangeiro cerca de 50 milhões de euros por uma participação cujo valor seria, naquela data, negativo, e dizer que o outro accionista privado seria reduzido a pó, como se veio a verificar…

Foi o pai do plano de recuperação da TAP, que envolveu medidas inéditas e vedadas aos empresários privados, que consistiram em cortes significativos dos salários e um despedimento colectivo (anulado pelos tribunais, por ilegalidade) e que culminou com um aporte de capitais públicos de 3.200 milhões de euros.

Cometeu um erro de percepção política quando anunciou, sem cobertura do primeiro-ministro e do Conselho de Ministros, a nova localização do(s) aeroporto(s) de Lisboa, o que conduziu a uma das maiores humilhações e vexame políticos da nossa democracia. Nem assim se demitiu…

Não contente com tal humilhação, a arrogância, conjugada com ignorância, decidiu passar a gerir a TAP via WhatsApp, num informalismo e impreparação profissional postos a nu na comissão parlamentar de inquérito à TAP.

Relembro apenas dois episódios dessa gestão: a autorização do despedimento e pagamento da indemnização milionária à administradora Alexandra Reis, que primeiro negou e depois se lembrou, e a cobertura ao seu secretário de Estado para alterar um voo para agradar a Sua Excelência o Senhor Presidente da República em detrimento de centenas de passageiros. Tais erros ou cicatrizes levaram inelutavelmente ao pedido da sua demissão.

No referido discurso aos seus apoiantes (entre os quais despontava o Ministro da Educação ou o Presidente da Câmara Municipal de Gaia, condenado por peculato e perda do seu mandato), acusa despudoradamente a direita de ter cortado as pensões e os investimentos na escola pública e no SNS e de se aliar no futuro ao Chega, partida racista e xenófobo.

Se não fosse para rir era mesmo para chorar. Esqueceu-se que esses cortes foram negociados e acordados entre o então primeiro-ministro Sócrates com a troika e a conjuntura económica que a isso a respectiva governação conduziu.

Numa entrevista no mesmo dia para a SIC, não escondeu que se for necessária uma aliança com a extrema-esquerda (apoiante de Putin, contra a NATO e com posições anti-semitas) para tomar de assalto o poder não hesitaria.

Finalmente, decretou que nos próximos quatro meses não se falaria do processo judicial de tráfico de influências que abalou o nosso sistema político. Infelizmente a realidade lhe ditará que muita água correrá sobre esse leito, pois não é fácil esquecer que o Chefe de Gabinete tinha espalhado dinheiro vivo na residência oficial do primeiro-ministro, que o ex-melhor amigo do primeiro-ministro está indiciado por tráfico de influências e que existem escutas comprometedoras do primeiro-ministro.

Dizer que o desenrolar do referido processo judicial foi um golpe de Estado, quando a procuradora foi escolhida pelo governo de António Costa, contra tudo e contra todos, ou que a montanha pariu um rato quando ficou indiciado um crime de tráfico de influência é um escândalo. Dito isto, se o PS malgré tout ganhar as eleições ou montar uma nova gerigonça não são os pobres que votam no PS, mas sim os pobres de espírito.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.