Quando se fala dos problemas do funcionamento dos serviços públicos ou, mais genericamente, dos problemas da acção do Estado, muitos parecem esquecer-se que o Estado mais não é que um sistema composto por indivíduos, e o seu comportamento, moldados por regras implícitas e explícitas.

É, assim, imperioso que se perceba o papel determinante das pessoas que servem o Estado, para o bom ou mau desempenho do mesmo.

As leis e as regras são também essenciais e podem guiar comportamentos e atitudes. Mas nada é mais importante do que a conduta daqueles que têm como função representar e servir o Estado.

Se olharmos para os grandes problemas dos Estados vamos encontrar, sistematicamente, actos e omissões graves por parte daqueles que deviam estar a fazer o melhor em nome do Estado e estão, tantas vezes, a fazer o pior.

Note-se que os servidores públicos englobam muitas profissões e diferentes tipos de ligação ao Estado. Desde políticos com responsabilidades executivas, passando por administradores e funcionários de empresas públicas ou de entidades reguladoras, magistrados, médicos do SNS, professores do ensino público, militares e demais funcionários públicos, todos estão a ganhar a sua vida a servir o Estado. Têm a obrigação de o fazer bem.

No sector privado, usa-se muito a expressão “vestir a camisola”. Todos os gestores sabem que os seus recursos humanos são o principal capital das empresas e que funcionários que não estejam alinhados com a missão, valores e regras de comportamento da empresa, não têm lugar nessa instituição. Exactamente o mesmo tem que acontecer no sector público.

Quem está a servir o Estado tem que o fazer de acordo com os valores do mesmo (que estão consagrados na nossa Constituição), independentemente do governo em exercício, sempre tendo em vista o bem-estar global da comunidade.

Quando um funcionário ou gestor do sector privado não cumpre as suas funções, ou é desonesto ou corrupto, está a prejudicar a empresa. Quando um servidor público faz o mesmo, está a prejudicar-nos a todos. Nesse sentido, os que servem o Estado têm uma responsabilidade acrescida e devem, por isso, ter também uma fiscalização muito apertada.

Infelizmente, em Portugal abundam os casos de desrespeito pelo Estado, que tantas vezes passam sem punição. É tempo de fazer com que aqueles que estão a servir o Estado, que nos estão a servir a todos, sejam obrigados a “vestir a camisola” do serviço público e não a dos seus interesses privados.

Combater fortemente os corruptos, aqueles que entram no Estado para o destruir (porque politicamente são contra a existência do Estado) ou os incompetentes, é a receita para que o Estado funcione bem e cumpra a sua função de garante da justiça e bem-estar públicos.

Para isso, precisamos de actuar a três níveis:

1. Nos processos de selecção das pessoas para os serviços públicos, que têm que ter critérios mais exigentes, para seleccionar os melhores, e têm que ser mais eficazes a detectar aqueles que não têm moral pública;

2. Na fiscalização e penalização dos que não cumprem o seu papel – o que passa por mais transparência e eficácia das entidades de regulação e controlo, e pela criação de leis que alarguem o âmbito do crime de corrupção e o penalizem muito mais;

3. Finalmente, na criação de incentivos e regalias que compensem os que fazem o bem do Estado, em vez de se aproveitarem dele.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.