Com produção de efeitos ao início de março, foi recentemente publicada pelo Banco de Portugal a Instrução n.º 2/2021, que procede à determinação de fatores adicionais e tipos indicativos de risco potencialmente mais reduzido e mais elevado de branqueamento de capitais e financiamento do terrorismo e, bem assim, à incorporação das orientações conjuntas sobre fatores de risco e medidas de diligência simplificadas e reforçadas emitidas pelas Autoridades Europeias de Supervisão (JC/GL/2014/37).

Recorde-se a este propósito que a legislação em matéria de prevenção de branqueamento prevê, também por parte das entidades obrigadas, uma abordagem baseada no risco; prevê – ainda – que as autoridades com poder de supervisão definam em regulamento os fatores e tipos indicativos de risco, bem como as medidas de diligência a considerar pelas entidades obrigadas nas suas próprias políticas internas.

A presente instrução é, assim, uma notícia há muito esperada por instituições de crédito, instituições de pagamento e de moeda eletrónica com sede em Portugal, bem como por instituições de pagamento com sede noutro Estado-membro que operem em Portugal através de agentes ou distribuidores.

De que falamos então?

Sabendo-se que a prevenção do branqueamento e, sobretudo, o financiamento do terrorismo são fenómenos internacionais por definição, conhecendo-se a predisposição dos grupos criminosos para explorar as fragilidades do sistema e, sobretudo, não se ignorando a tradição mimética que o setor financeiro amiúde evidencia na definição de produto ou processos relacionados com o Cliente, o Banco de Portugal publica uma lista exemplificativa de fatores e tipos indicativos de risco de branqueamento de capitais ou de financiamento do terrorismo potencialmente mais reduzido ou elevado.

A ideia é que esta listagem seja um ponto de partida para a análise e definição de políticas de risco das entidades financeiras, devendo estas entidades considerar outros fatores e tipos indicativos de risco potencialmente mais elevado que se mostrem adequados aos seus processos e operação específicos.

A lista é razoavelmente previsível (os suspeitos do costume), o que nesta matéria não pode deixar de se ter por adequado.

Assim, prevê-se o risco baixo de produtos financeiros não complexos e de baixa rentabilidade ou retorno, bem como de produtos de utilização limitada ou finalidades específicas e pré-determinadas, tais como produtos de poupança de prazo fixo com limiares de poupança baixos, ou produtos cujos benefícios apenas podem ser concretizados a longo prazo ou por um motivo específico, como a reforma ou a aquisição de um imóvel para habitação própria e permanente.

Em contrapartida, prevê-se como tendo risco elevado clientes que exerçam atividades económicas em setores propensos a evasão fiscal ou que sejam considerados, por fontes idóneas e credíveis, como tendo risco elevado de branqueamento de capitais e de financiamento do terrorismo (exemplificando-se com os setores do imobiliário, do jogo, dos transportes ou dos leilões), bem como os que exerçam atividades económicas em setores frequentemente associados a elevados índices de corrupção (ainda que indefinidos).

Todavia, consideramos que a delimitação de alguns dos fatores de risco identificados carecem ainda de aprofundamento e maior detalhe na regulação.

Por exemplo, o regulador bancário limita-se por ora a identificar o risco potencialmente elevado de “produtos ou serviços associados a ativos virtuais” ou “produtos de moeda eletrónica sem limitação no que se refere ao (i) número ou montante dos pagamentos, carregamentos ou reembolsos permitidos; ou (ii) valor monetário armazenado eletronicamente”. Fá-lo de forma genérica, seguindo a algo reticente abordagem usualmente observada na zona euro quanto aos virtual assets. Sobre esta matéria, considerando a [distinta] abordagem prosseguida nos diversos blocos económicos e a experiência acumulada no Regulador, entendemos que a abordagem peca por excessiva neutralidade.

De igual modo, encontramos referências ao risco baixo de “transferências recorrentes, nomeadamente através de débito direto, de montante idêntico e para o mesmo beneficiário, com aparente racionalidade económica”. Compreendendo-se o racional, não pode deixar de se sublinhar a necessidade de conjugar a “aparente racionalidade económica” com outros fatores, sobretudo considerando os estudos conhecidos sobre o financiamento do terrorismo na Europa.

Assim, esta instrução deve agora ser acompanhada de pedagogia, de proximidade exigente na relação entre regulador e entidades reguladas. Porque, como alguém escreveu, “quem acende uma luz é o primeiro a beneficiar dela”.