Quando pensamos em paraísos fiscais não conseguimos deixar de lhes associar certas características como a ausência de controlo das actividades desenvolvidas, a falta de transparência, a injustiça fiscal e a imoralidade.

São verdadeiros estratagemas de fuga e evasão fiscal em que as empresas e pessoas não registam os lucros no país onde fazem negócios e ganham dinheiro, fazem-no nos paraísos fiscais, porque podem. Ou seja, os seus lucros não são sujeitos a impostos sobre rendimento nem as suas receitas são taxadas.

Não se estranha que esta seja uma das formas mais comuns de evasão fiscal internacional, estimando-se que haja uma concentração de 26% da riqueza mundial nos paraísos fiscais.

Não pagar impostos, fugir ao pagamento das obrigações fiscais e esconder dinheiro, é disto que se trata. Não há qualquer justiça num sistema em que a generalidade dos cidadãos vive num autêntico inferno fiscal, enquanto uns gozam do privilégio de pouco ou nada pagarem em impostos pelos seus rendimentos avultados.

Os paraísos fiscais são inseparáveis do agravamento das desigualdades, da pobreza e da insustentabilidade do modelo económico que se vai instalando no mundo. A lei deve ser igual para todos e ninguém, por muito dinheiro que tenha, deveria ter um tratamento diferenciado.

Estas isenções fiscais saem-nos caras porque representam fuga de capitais e perda de receita fiscal para o Estado. Estima-se que 23,9% do PIB é desviado para offshores, representando uma perda de receitas fiscais num valor equivalente a 1% do PIB.

Por outras palavras, fragilizam as bases financeiras do Estado e não criam riqueza para o país, colocando em causa as suas receitas e recursos que poderiam ser canalizados para áreas absolutamente prioritárias, como serviços públicos e políticas sociais.

Segundo um estudo da Comissão Europeia, entre 2001 e 2016, alguns portugueses “desviaram” cerca de 50 mil milhões de euros para offshores, tornando-se Portugal o terceiro país da União Europeia que mais riqueza transferiu para paraísos fiscais.

Só em 2018 foram transferidos 8,95 mil milhões de euros e realizadas 113.875 transferências, sendo a Suíça e Hong Kong os destinos preferidos.

Como se não bastasse, os paraísos fiscais também foram o palco de alguns acontecimentos como a falência de bancos ou as fraudes em larga escala. Será oportuno recordar os processos escandalosos do BCP, BPP ou BPN, que indiciaram práticas relacionadas com empresas sediadas em paraísos fiscais e cuja factura, nalguns casos, acabou por ser paga pelos contribuintes.

Se, por um lado, a ONU e a OCDE aconselham, há décadas, um combate à utilização dos paraísos fiscais, por outro, optam por insistir na necessidade de troca de informações entre os paraísos fiscais e os restantes Estados, o que é importante, mas não resolve o problema de continuarem a existir.

Também em Portugal têm surgido algumas tentativas de alteração do enquadramento jurídico dos paraísos fiscais, mas sem grande sucesso. Acima de tudo, é preciso ter como objectivo a extinção deste mecanismo para combater práticas que favorecem quem pretende fugir às suas obrigações fiscais e para termos um sistema fiscal justo, transparente e credível.

Se é verdade que o Governo não pode impor o fim dos paraísos fiscais fora das suas fronteiras, também não pode esperar passivamente que o problema se resolva. Pode, e deve empenhar-se, junto dos restantes Estados e das Organizações Internacionais, para encontrar soluções para acabar com os paraísos fiscais, que são uma injustiça e uma imoralidade económica, financeira, social e política.

É hora de pôr fim aos paraísos fiscais e já vamos tarde.

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.