A participação do Novo Banco, de 96%, no fundo da C2 Capital Partners está avalizada a título pessoal por Luís Filipe Vieira, revelou hoje Nuno Gaioso Ribeiro na audição da Comissão Eventual de Inquérito Parlamentar às perdas registadas pelo Novo Banco e imputadas ao Fundo de Resolução, que ainda está a decorrer.
Nuno Gaioso Ribeiro é o founding partner e CEO da C2 Capital Partners (antigo Capital Criativo) e foi também vice-presidente do Benfica.
O fundo da ex-Capital Criativo está a gerir a dívida que a Promovalor tinha no Novo Banco e foi chamado responder sobre a reestruturação da dívida da empresa que era a cabeça de um grupo imobiliário no qual Luís Filipe Vieira detinha 80% do capital. Recorde-se que o Fundo de Resolução pediu uma auditoria a uma reestruturação feita pelo Novo Banco à dívida da Promovalor, que está a ser feita pela BDO.
O acordo a que Luís Filipe Vieira chegou com o Novo Banco no fim de 2017 para reestruturar a dívida implicou a aquisição pelo fundo FIAE (Fundo de Investimento Alternativo Especializado) dos créditos detidos pelo Novo Banco sobre a Promovalor, sendo o Novo Banco também dono desse fundo (detentor de unidades de participação).
Nuno Gaioso Ribeiro defendeu aos deputados a constituição do fundo que adquiriu os créditos para, através destes, “aceder à propriedade dos ativos, para os explorar, desenvolver e alienar a prazo, desejavelmente em melhores condições de mercado”. O fundo absorveu vários terrenos e projetos imobiliários da Promovalor, controlada pela família Vieira.
O fundo de private equity é detido em 96% pelo Novo Banco, e segundo Nuno Gaioso os créditos adquiridos são de 133,9 milhões de euros e foi concedida pelo banco nova liquidez de 12,2 milhões de euros, o que totaliza 146,1 milhões de euros.
Nuno Gaioso diz que na reestruturação do crédito o banco trocou créditos com poucos ou mesmo sem colaterais, alguns no Brasil onde havia credores privilegiados que teriam primazia sobre o Novo Banco, por capital e hoje o banco tem a plena posse dos ativos e das garantias. “O montante de garantia foi reforçado e sobretudo foi desonerado de créditos e de privilégios de terceiros”, disse o fundador da sociedade de capital de risco que gere fundo para o qual o Novo Banco transferiu em 2017 parte dos créditos de Luís Filipe Vieira.
“Tratando-se de créditos que foram aplicados em ativos imobiliários e turísticos com retornos financeiros de longo prazo e grande iliquidez, uma solução de execução ou venda rápida dos ativos ou dos créditos (e, provavelmente, parcial) parecia ser, objetivamente, desfavorável para o credor”, disse ainda Nuno Gaioso.
“A execução judicial de Luís Filipe Vieira seria desfavorável” para o Novo Banco disse Nuno Gaioso Ribeiro, que salientou que a reestruturação da dívida da Promovalor através da criação do FIAE, em 2017, permitiu “evitar a venda “descontrolada” e numa conjuntura recessiva dos ativos, ao mesmo tempo que “reforçou, materialmente, as garantias do Novo Banco face a esses ativos”. Entre os ativos estão terrenos em Loures, Alverca e Tavira, um imóvel em Espanha, um edifício de escritórios em Maputo, Moçambique, e um hotel em Recife, no Brasil, que “está fechado desde o inicio da pandemia e que pretendemos abrir com outra marca e outro operador” para valorizar o ativo. O edifício em Moçambique foi concluída a construção e foi renegociada a dívida com o credor, disse ainda.
“Aos créditos em causa correspondiam ativos reais”, defendeu realçando que “uma solução rápida de venda dos ativos seria adversa aos interesses do credor”. “O Novo Banco, ao decidir pela constituição do Fundo, tem hoje uma posição patrimonial, económica e jurídica mais sólida do que dispunha antes”. Nuno Gaioso Ribeiro recusou que tenha havido qualquer perdão de dívida.
Condições excecionais favorecem Novo Banco
Nuno Gaioso explicou ainda que esta operação teve duas condições excecionais, que descreveu: “A manutenção integral dos avales, que estão vivos, quer no que diz respeito à dívida, quer no respeito ao capital” e o facto de “a nova liquidez ter privilégios sobre a anterior, ou seja, o new money não prevalece sobre o old money“. Portanto os avales dos sócios da Promovalor estão vivos e podem ser acionados havendo incumprimento da dívida ou da devolução do capital.
Segundo descreveu o gestor da ex-Capital Criativo, agora C2 Capital Partners, portanto a diferença entre o valor do capital subscrito pelo Novo Banco no fundo e o valor que vai receber está assegurada por um aval dos sócios da Promovalor. O Jornal Económico confirmou que o aval que garante o valor que o banco vai recuperar da participação do fundo é de Luís Filipe Vieira, presidente do Benfica.
“O devedor entregou o ativo e manteve o aval sobre a dívida”, realçou. “Foi feito um mecanismo, em que o Novo Banco colocou metas de recuperação de capital, que se não forem cumpridas o banco tem a opção de venda da participação do fundo ao sócio do fundo por um valor que está avalizado”. Esse sócio é o presidente do Benfica.
O Novo Banco entrou com dinheiro no fundo e esse dinheiro é que foi usado para comprar os créditos, explicou à deputada do CDS, Cecília Meireles.
Na reestruturação da dívida da Promovalor foi constituído o fundo FIAE (Fundo de Investimento Alternativo Especializado) da então Capital Criativo, depois de ter sido registado junto da Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM). Este fundo teve como objetivo a aquisição dos créditos detidos pelo Novo Banco sobre a Promovalor. Arrancou com um capital inicial de 146 milhões de euros (explicado por Nuno Gaioso com valor dos ativos e com o nova liquidez) com três investidores institucionais o Novo Banco, o fundo da Capital Criativo e a Promovalor e dois investidores particulares. O fundo tem a duração de cinco anos, com possibilidade de renovação.
Este fundo de private equity ficou “ainda com alguma liquidez”, revelou Nuno Gaioso Ribeiro.
Ao Expresso Nuno Gaioso Ribeiro chegou a dizer que “comprámos os créditos sem desconto e sem perdão”, sendo que “alguns desses ativos podem ter dívida associada que ficam no fundo”.
Nessa entrevista dada ao Expresso, o gestor do fundo disse que, do capital inicial, 90% serviram para trocar créditos por capital do fundo, isto é, unidades de participação e 10% representam liquidez que ainda está no fundo. Nesta operação o Novo Banco “coloca” dinheiro no fundo que compra as dívidas associadas aos ativos que são transferidos para o FIAE. O prazo de pagamento foi prolongado por, pelo menos, mais cinco anos.
Mariana Mortágua, deputada do Bloco de Esquerda, chamou ao inquérito o facto de em março de 2017, o banco ter aprovado um empréstimo no valor de 8,6 milhões de euros a uma das empresas da Promovalor, o projeto Reserva do Paiva no Brasil, detido em parceria com a Odebrecht. Um financiamento com uma duração de 72 meses, tinha como objetivo servir como apoio à tesouraria da empresa Reserva do Paiva. Segundo uma notícia do Expresso, o empréstimo foi avalizado pelo maior acionista da Promovalor, Luís Filipe Vieira, e pelo acionista minoritário, Manuel Almerindo Duarte.
Foi também em 2017 que o Novo Banco deixou de ter qualquer participação na Benfica SAD e essa participação de 8% foi vendida ao empresário José António dos Santos, tal como destacou o deputado do PCP Duarte Alves.
Em 2018 a exposição total do Novo Banco à Promovalor era de 760 milhões de euros, tendo já gerado perdas de 225 milhões de euros. Mas se em 2014 o Novo Banco era credor de Luís Filipe Vieira, em 2018 “já era sócio” de Luís Filipe Vieira num fundo de investimento para onde transitou o crédito do banco à Promovalor numa operação de reestruturação.
Quando o BES colapsou, Vieira era um dos maiores devedores do banco, com uma dívida superior a 400 milhões de euros relacionada com vários negócios do ramo imobiliário.
O Novo Banco registou imparidades com a participação com os 96% do fundo do C2 Capital Partners, por “desvio do business plan“, entre 2017 e 2018. Nuno Gaioso Ribeiro explicou que o desvio se deve ao facto de o fundo só ter tido a propriedade do hotel no Brasil no fim de 2019, devido a um litigio judicial com o construtor que só permitiu transferir a propriedade do hotel da Promovalor para o fundo nessa altura. O fundo até aí tem apenas o crédito sem o ativo o que afeta o valor do ativo.
O fundo tem cinco ativos sob gestão.
Nuno Gaioso Ribeiro diz que em 2017 o valor do fundo era de 140,398 milhões e em 2018 passou a ser de 123,171 milhões (diferença de 22 milhões de euros).
Cecília Meireles lembrou que a auditoria da Deloitte aponta perdas ao Novo Banco com a participação neste fundo de 83 milhões de euros.
Notícia atualizada às 19h18
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