Existe uma tendência a nível global para uma maior exigência em termos de transparência na vida política e no exercício dos cargos públicos. Durante décadas, os partidos do chamado centro político foram fustigados com situações e escândalos que ajudaram a deteriorar a confiança entre os cidadãos e os partidos tradicionais. Este efeito foi muito visível em primeiro lugar em Itália, onde na década de 90 a gigantesca “operação mãos limpas” levou a profundas mudanças no ecossistema partidário, com os principais partidos de governo da altura – o partido da Democracia Cristã, ou o Partido Socialista Italiano apenas para citar alguns exemplos – a desaparecerem, ou a reformularem-se profundamente.
Neste momento, também em Itália, os partidos políticos preparam-se, em vésperas de eleições cruciais, para o fim do financiamento público do sistema partidário. Menos financiamento público, melhor democracia? Pode ser popular, mas é pouco claro que traga melhorias ao sistema político.
Existirão poucas coisas que representem uma boa aplicação dos nossos impostos como a manutenção de um sistema plural e liberto de interesses, ainda que com defeitos, como é o caso da democracia ocidental. Hoje, num mundo em que a tecnologia e as redes sociais tornam o acesso à informação mais rápido – e em que a pressão dos cidadãos em torno de uma causa dentro destas redes sociais pode causar mais mossas que as tradicionais manifestações na rua – existe de facto a necessidade de melhorar o sistema democrático e de torná-lo mais inclusivo, mais aberto, e mais exigente. Mas esta abertura pode acabar por ser um equilíbrio complexo, e aquilo que por vezes parece uma boa medida de governança, por vezes pode trazer um lado perverso.
Regressemos a Itália. Berlusconi marcou uma geração política no país transalpino, após o período “mãos limpas”. A que nível o seu império dentro do sector dos media foi alheio a esta popularidade? Este não é caso único na Europa, isso é certo, mas até que ponto poderemos garantir que – por razões de maior transparência nos dinheiro públicos – não estamos de facto a abrir as portas (alguns dirão ainda mais) aos interesses corporativos que colidem amiúde com o interesse público? Ou, pior cenário, se não estaremos a abrir a porta para que interesses estrangeiros se sobreponham a uma agenda nacional ou europeia?
A escolha acertada, de facto, vai para além do que parece óbvio numa casual conversa com amigos. O sistema político necessita de regeneração e de melhores regras, é certo, mas na condição destas não se tornarem num pesadelo para os que fazem do serviço público uma opção de vida. Cortar o financiamento público ao sistema político pode ser popular, mas irá escancarar a porta ao populismo corporativo.