Os centros de saúde é o tema deste artigo, mas permitam-me que comece por assinalar que a recente medida governamental de redução dos preços dos passes sociais nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto teve o efeito de uma bomba: com relativamente pouco dinheiro, o Governo conseguiu atingir objectivos de solidariedade social, de promoção do transporte colectivo e de aumento do rendimento disponível.
Esta foi uma espécie de medida ‘três em um’ que vai beneficiar especialmente os trabalhadores mais jovens e as classes média e baixa. Trata-se de algo tanto mais importante se se tiver em conta que um jovem das classes média e baixa terá actualmente uma probabilidade não superior a 30% de vir a ser melhor sucedido materialmente que a geração que o antecedeu. Esta é uma realidade profundamente preocupante para o regime democrático e que sinaliza um problema de fundo: o elevador social parou de funcionar, ou funciona de forma muito intermitente.
E é aqui que os centros de saúde entram neste artigo. O acesso à saúde é fundamental para que a igualdade de oportunidades não seja mera retórica sem conteúdo. Dito de outro modo, a intervenção governamental na área da saúde é fundamental para fomentar a igualdade de oportunidades e restaurar o elevador social.
Em Portugal, tal como nos restantes países da OCDE, os gastos com a saúde, no período entre 2000 e 2016, em média, subiram o equivalente ao PIB nominal acrescido de mais 1,9%. Isto significa que os gastos de saúde, entre despesa pública e despesa das famílias, cresceram entre 4% e 6%.
Naturalmente, existirá sempre espaço para uma optimização e para ganhos de eficiência, como os sistemas mutualistas e cooperativos têm ilustrado à saciedade. Ganhos que por vezes têm sido difíceis de obter devido à ausência dos adequados instrumentos de gestão na administração do SNS.
Feita esta ressalva, em todo o caso a realidade é insofismável: as despesas de saúde têm crescido quase dois pontos percentuais acima do PIB nominal, ano após ano, em todos os países da OCDE. Perante esta realidade torna-se evidente a urgência na definição de opções orçamentais estruturais nesta área.
Isto dito, importa notar que os sistemas e os países onde os custos de saúde têm estado mais equilibrados são aqueles onde os actores de proximidade, como é o caso das farmácias e dos centros de saúde, se complementam.
Ora, de modo a garantir um menor esforço orçamental da parte do Estado e das famílias, é de vital importância que os centros de saúde assegurem a todos os cidadãos um médico de família, que tenham especialistas em saúde oral, nutrição, psicologia, entre outras especialidades. Estes são um instrumento de vital importância para assegurar a igualdade de oportunidades na prevenção e nos cuidados primários, uma condição quase basilar para se realizar o desígnio de sociedades que têm como prioridades promover o elevador social, a justiça e a integração.
Por isso a questão inicial: os passes sociais e os cuidados de saúde primários são duas faces de uma mesma moeda de uma sociedade mais justa. A existência dos passes sociais não nos deve fazer esquecer do longo caminho que ainda há a percorrer noutras áreas, como é o caso da saúde de proximidade.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.