Recorde de investimento, menos vendas e passivos das SAD com tendência para aumentar, assim como os gastos com os direitos de futebolistas. Os passivos das empresas que gerem o futebol profissional dos três grandes estão todos acima dos 380 milhões de euros com a SAD do FC Porto a destacar-se pela negativa: 547,9 milhões, mesmo após uma recuperação do último semestre de 2023/24 para o primeiro de 2024/25.
Nunca a Liga portuguesa tinha superado os 300 milhões de euros na contratação de futebolistas e o recorde anterior tinha sido atingido em 2023/24, época em que foram investidos 282,8 milhões de euros. Nesta temporada, foram batidos todos os recordes de investimento: 337 milhões gastos e quase 270 milhões foram da responsabilidade dos três grandes. E nas vendas? Esse é o “elefante na sala” do futebol português. Da época anterior para esta, os clubes da principal Liga portuguesa perderam 200 milhões de euros em vendas (de 588,9 milhões de euros para 388,6 milhões).
Aversão a receitas
Perante o cenário de um maior investimento sem um aumento evidente das receitas, não é de descurar o risco do aumento do passivo.
Rui Lança, diretor desportivo do clube saudita Al-Ittihad e especialista em gestão desportiva, realça ao JE que “o buraco vai sempre aumentar” e que a questão passa por “perceber até que ponto é viável, no ponto de vista da sustentabilidade financeira, que Portugal consiga investir neste patamar, sobretudo partindo do princípio de algo que é incontornável: o mercado em Portugal é muito limitado. E daí a importância de entrar na Liga dos Campeões que garante uma receita entre os 30 e os 40 milhões de euros mas cuja receita não irá aumentar todos os anos”. Daí que a venda dos passes de futebolistas seja “uma fatia muito importante dessa receita também e nesta janela houve uma opção dos clubes em reter os jogadores mais valiosos e com mais qualidade”.
Noutro espectro, este especialista vê “um lado conservador nos clubes e uma certa aversão a determinados tipos de receitas, como é o caso do naming dos estádios e da aceitação de coligações com fundos e outros clubes que gerem receitas como vemos que estão a ser incrementadas em Inglaterra e outros países”. Rui Lança defende ainda que “já se percebeu que as possíveis receitas da centralização dos direitos televisivos não irão de encontro às expectativas sobretudo dos clubes que mais investem. A consequência disso pode ser que os clubes tenham que vender mais jogadores do que aquilo que tinham planeado porque é uma receita fácil e imediata”.
Só os “leões” ficaram no verde
Dos três grandes, só a Sporting SAD conseguiu terminar o mercado no verde. Muito mais comedida em contratações mas também com a melhor venda deste mercado (Viktor Gyokeres), a SAD termina o mercado com um saldo positivo de 60 milhões (rei das vendas com 128,5 milhões e o mais frugal nas aquisições: 68,8 milhões) enquanto os rivais ficam no vermelho: FC Porto com prejuízo de 16,6 milhões (compras recorde de 94,3 milhões e 77,7 milhões em vendas) e SL Benfica com défice de 8,5 milhões de euros (comprou 105,5 milhões e vendeu 97 milhões).
Se analisarmos os últimos relatórios e contas (só a Benfica SAD apresentou os números totais da época passada enquanto Sporting CP e FC Porto apenas têm disponíveis as contas do primeiro semestre da temporada anterior), é possível perceber a postura mais cautelosa da SAD dos “leões”: se o ativo aumentou 46,4 milhões para 420,8 milhões, também é verdade que o passivo também cresceu (mais 31,4 milhões para 384,8 milhões). Neste momento, os capitais próprios da SAD liderados por Frederico Varandas estão nos 35 milhões positivos, após um crescimento de 15 milhões, o mesmo valor do lucro que foi exposto relatório e contas.
Intervencionada pela UEFA, a SAD do FC Porto prometeu um mercado recorde e cumpriu. Os “dragões” superaram em 30 milhões o anterior mercado mais gastador e resta saber como vão as contas dos azuis e brancos aguentar esse impacto. O último relatório e contas conhecido (referente ao primeiro semestre da época passada) mostra um lucro residual de 334 mil euros e se o ativo aumentou (incremento de 93,4 milhões para 500,5 milhões), o passivo também: 27 milhões para 547,9 milhões. É o maior passivo do futebol português. Os capitais próprios são negativos em 47,3 milhões apesar da recuperação de 66,4 milhões desde o último exercício.
Até ao momento, só a Benfica SAD deu a conhecer as contas relativas à época passada e se tudo parece bem encaminhado (aumento do ativo e diminuição do passivo), há um item que pode levantar algumas preocupações. Num exercício em que o lucro foi de 34,4 milhões de euros (que sucede a um prejuízo de 31,4 milhões em 2023/24), a subida do ativo dobrou o incremento do passivo: o ativo subiu 4,6% para 591,2 milhões face ao exercício anterior e o passivo desceu 1,8% para 474,9 milhões de euros. Se em 2023/24 os capitais próprios eram de 81,8 milhões de euros, em 2024/25 estes subiram para 116,3 milhões de euros. Face ao maior investimento, é inevitável uma subida também dos gastos com direitos de atletas que na época passada apresentou um crescimento de 10,7% para 297,3 milhões.
Resta-nos esperar pelos relatórios e contas de Alvalade e Dragão relativos à época passada para perceber como é que estes números serão agravados.
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