A dependência que Portugal ainda tem face aos combustíveis fósseis é duplamente indesejável.

Primeiro, porque não tendo esses recursos naturais no nosso território, estamos numa posição de comprador passivo, sujeito às flutuações dos preços nos mercados internacionais, que facilmente desencadeiam crises quando os preços sobem demais.

Depois, porque a utilização desses combustíveis contamina o planeta e dificulta o cumprimento das nossas quotas de poluição. Mais, são fontes não renováveis e esgotáveis de energia.

A grande vantagem do petróleo e afins é o sistema económico estar montado na lógica da sua utilização. Ou seja, a transição para outras fontes de energia requer uma mudança sistémica, que é sempre custosa inicialmente.

Em Portugal, temos aproveitado a energia hídrica (das barragens) e eólica, mas temos muito caminho a percorrer na utilização da energia solar, da biomassa, das marés ou do hidrogénio.

Sendo Portugal um país pequeno, sem peso nas negociações internacionais, transformarmo-nos num país independente energeticamente seria um passo fundamental para a nossa autonomia social e política, e para o nosso bem-estar.

Adicionalmente, só essas fontes energéticas alternativas são sustentáveis a longo prazo (porque se renovam e não produzem o aquecimento do planeta), pelo que a aposta nelas é a única forma de garantir um bom futuro. Mais, a transição energética é também uma oportunidade para se efectuarem transformações estruturais que sejam conducentes a mais independência.

As recentes greves dos camionistas de matérias perigosas são um bom exemplo de uma situação que deve ser evitada num novo paradigma energético: o abastecimento de energia para as diferentes actividades económicas nunca pode estar na mão de centenas de trabalhadores ou de uma ou duas empresas.

Esse abastecimento tem que ser automático e garantido – imagine-se energia solar a fazer funcionar aeroportos, hospitais e veículos, ou hidrogénio a ser produzido localmente e entregue em contínuo pelos diferentes postos de distribuição.

Em sociedades complexas, interdependentes e em funcionamento contínuo, como as deste terceiro milénio, não podemos estar expostos a quebras energéticas ou quebras monetárias (energia e moeda são o “sangue” da economia). Assim, a provisão desses bens e serviços tem que estar sempre garantida, a não ser por razões incontroláveis como cataclismos naturais ou guerras.

Em Portugal, não podemos permitir que um sindicato que representa poucas centenas de trabalhadores ameace parar um país, nem que uma qualquer empresa de distribuição energética tenha o poder negocial para definir preços e impor as suas condições. O abastecimento energético é um assunto de Estado, e deve ser o Estado a garantir que esse abastecimento nunca falha e tem custos controlados.

A aposta nas energias renováveis, produzidas localmente e controlados pelo Estado democrático, é a única forma de não sermos sujeitos a chantagens de pequenos interesses ou de outras nações, ao mesmo tempo que é a única forma de garantirmos o futuro do planeta.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.