[weglot_switcher]

Personalidades JE: António Costa – O político do “salto em frente”

António Costa, sem ter a bonomia de Mário Soares, poderá tentar um percurso político semelhante, sendo que ainda lhe sobra tempo para corridas mais longas, admitindo que no fim do próximo mandato Presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa ainda terá mais vida política para gerir.
12 Dezembro 2020, 21h00

O Jornal Económico escolheu 30 personalidades dos últimos 25 anos que marcaram, pela positiva e pela negativa, a atual sociedade portuguesa: políticos, empresários, gestores, economistas e personalidades da sociedade civil. A metodologia usada para compilar as Personalidades JE está explicada no final do texto.

Há quem diga que António Luís Santos da Costa (Lisboa, 1961) não dá ponto sem nó, e que, para tal, ainda é beneficiado pela sua aptidão natural de negociador, pela excelente capacidade que tem para estabelecer pontes, selar acordos e construir “geringonças”. É o político do “salto em frente”. Veja-se que o facto de ter sido vereador na Câmara de Loures (de 1993 a 1995) posicionou-o na linha da frente para vir a ser, a partir de 1997, o responsável no Governo pela EXPO 98 e depois, em 2007, presidente da Câmara Municipal de Lisboa. A esmagadora maioria dos portugueses sabe qual foi o seu passo seguinte.

As suas ligações a Jorge Sampaio terão contribuído significativamente para a construção desse percurso, perfilando-o para primeiro-ministro. Sem ter a bonomia de Mário Soares, mesmo assim é bem provável que tente um percurso semelhante, sendo que ainda lhe sobra tempo para corridas políticas mais longas, admitindo que no fim do próximo mandato Presidencial de Marcelo Rebelo de Sousa ainda terá muita vida política para gerir.

Já se perde a conta das adversidades políticas que enfrentou, dos incêndios, aos problemas relacionados com o universo militar, até à tragédia da morte do cidadão ucraniano em instalações do SEF no aeroporto Humberto Delgado, em Lisboa, passando pelas “lutas” na área da Educação e da saúde, especialmente com a atual pandemia da Covid-19 e toda a profunda crise económica que tem vindo a provocar, com aumento do desemprego, com o flagelo no turismo e o risco de colapso na TAP. Como se diz em português corrente, os gatos têm sete vidas, mas António Costa tem mais vidas que os gatos.

Do seu lado materno, muitos jornalistas recordam carinhosamente Maria Antónia Palla, licenciada em Histórico-Filosóficas pela Faculdade de Letras de Lisboa, que foi jornalista e presidente da Caixa de Previdência dos Jornalistas, grande admiradora de Mário Soares. Do lado paterno, boa parte dos intelectuais portugueses de esquerda recordam Orlando Costa, escritor, dramaturgo e poeta, nascido em Lourenço Marques em 1929, com ascendência, do lado materno, na família Fréchaut Fernandes, familiar do dirigente da Frelimo, Sérgio Vieira, que assumiu cargos ministeriais no Governo de Moçambique.

Família brâmane

É do avô paterno de António Costa, de seu nome Luís Afonso Maria da Costa, que vem a sua origem goesa, descendente de famílias que tinham sido convertidas ao catolicismo, pertencentes à casta mais alta da Índia, com ligação genealógica a Marada Poi, hindu do século XVI oriundo de Margão, de uma família brâmane. O nome da família Costa radica de um filho de Marada Poi, também António da Costa, que nasceu na ilha de Salsete, ou Sashti, no noroeste da Índia, no Estado de Maharashtra, uma zona que esteve sob ocupação portuguesa entre 1534 e 1737, onde esse antepassado homónimo se casou com uma senhora de seu nome Leonor Coutinho, celebrando o matrimónio sob o ritual cristão. A família desse António manteve sempre o apelido Costa, e ele viveu como gancar, ou senhor de terras, em Raia, ao sul de Goa, nos arredores de Margão, a três dezenas de quilómetros de Panaji, ou Pangim, antigamente chamada Nova Goa, capital desse Estado.

Passadas três gerações, um seu trisneto, filho do brâmane Anta Poi, voltou a receber o nome António da Costa, já no século XVII, casando com Perpétua Colaço, neta de um Pedro Colaço, também convertido ao cristianismo, e igualmente gancar em Margão. Esse António teve um filho Salvador, nascido em Rachol, perto de Salsete, que casou com Leonor de Sá, da vila de Cortalim, localizada em Mormugão, também em Goa, onde houve um templo dedicado a Shiva, embora a zona seja predominantemente cristã. A família seguiu o seu rumo nos séculos seguintes até nascer Luís Afonso Maria da Costa, que já viveu em Moçambique, avô do atual primeiro ministro português.

O irmão Ricardo

António Costa, o político e jurista português, é desde novembro de 2014 secretário-geral do Partido Socialista. Foi presidente da Câmara Municipal de Lisboa de 2007 a 2015 e é primeiro-ministro de Portugal desde 26 de novembro de 2015. É irmão do jornalista Ricardo Costa, filho de Orlando da Costa e de Inácia Martins Ramalho de Paiva.

Licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, foi dirigente associativo da Associação Académica desta Faculdade (AAFDL, 1982–1984) e diretor da Revista da AAFDL (1986–1987), pós-graduado em Estudos Europeus, pelo Instituto Europeu da Universidade Católica Portuguesa, admitido em 1988 na Ordem dos Advogados, depois de estagiar no escritório de José Vera Jardim e Jorge Sampaio, a sociedade Jardim, Sampaio, Magalhães e Silva & Associados.

Promovido à direção nacional do PS pelo sampaísta Vítor Constâncio, apoiou Jorge Sampaio na liderança do partido contra António Guterres, em 1992, e foi o seu diretor de campanha para as eleições presidenciais de 1996. O PS escolheu Costa como cabeça de lista à Câmara Municipal de Loures nas autárquicas de 1993 e apenas por dezenas de votos não conquistou essa autarquia à CDU (PCP-PEV).

Ferrari contra burro

Ficou famosa a corrida que organizou nessa campanha, entre um burro e um Ferrari, na Calçada de Carriche, à hora de ponta, ganha pelo burro, para demonstrar os problemas de acessibilidade existentes neste concelho. Em 1995, na sequência das legislativas ganhas pelo PS para formar o XIII Governo Constitucional, participa nos governos de António Guterres – apesar de ter apoiado Jorge Sampaio contra Guterres, no congresso de 1992 – como Secretário de Estado dos Assuntos Parlamentares, passando depois a Ministro dos Assuntos Parlamentares do mesmo governo.

No segundo governo de Guterres, o XIV Governo Constitucional, foi-lhe atribuída a pasta da Justiça, da qual se demitiu em 2002. Regressado à Assembleia da República, apoiou Ferro Rodrigues na sucessão a Guterres. Foi apoiante de José Sócrates nas eleições diretas do PS que opuserem Sócrates a Manuel Alegre e João Soares, em 2004. Foi convidado para o governo de Sócrates, como ministro de Estado e da Administração Interna do XVII Governo.

Em 2007 José Sócrates, primeiro-ministro e líder do PS propôs a Costa a candidatura do PS à Câmara Municipal de Lisboa – após a demissão de António Carmona Rodrigues –, sendo eleito Presidente da Câmara Municipal, contra Fernando Negrão, do PSD. Foi reeleito em 2009, com 40,22% dos votos, e em 2013, com 50,91% dos votos e renunciou ao mandato a 6 de abril de 2015, sucedendo-lhe Fernando Medina.

Ganha liderança do PS a Seguro

Em 2014 disputou a liderança do PS a António José Seguro, e venceu essas eleições, com 67,88% dos votos, contra 31,65% de António José Seguro, que se demitiu do cargo de secretário-geral do PS. Costa passou a ser o candidato do PS ao cargo de Primeiro-Ministro nas eleições legislativas de 2015. Na sequência da demissão de Seguro, Costa foi eleito secretário-geral do PS com 96% dos votos.

A 4 de Outubro de 2015, António Costa procurou entendimentos com a Coligação Democrática Unitária e com o Bloco de Esquerda, apesar de várias figuras do PS, como Sérgio Sousa Pinto, terem manifestado descontentamento com uma coligação aos partidos à esquerda e, em protesto, Sousa Pinto apresentou a sua demissão dos órgãos nacionais do partido.

Atualmente, na estratégia de relançamento da economia contra os efeitos nefastos da pandemia da Covid-19, António Costa, enquanto Primeiro-Ministro, enfrenta incógnitas ao nível da evolução económica global – mesmo sabendo que 2020 termina com um maior nível de confiança, por poder dispor de vacinas a partir do início de 2021 –, com que nenhum anterior Governo foi confrontado, uma incerteza que pode adiar o crescimento do Produto Interno Bruto, potencia o aumento do desemprego e do número de falências.

METODOLOGIA

O Jornal Económico (JE) selecionou as 25 personalidades mais relevantes para Portugal nos últimos 25 anos, referentes ao período balizado entre 1995 e 2020, destacando as que exerceram maior influência no desenvolvimento da sociedade civil, da economia nacional, no crescimento internacional dos nossos grupos empresariais, na forma como evoluíram a diáspora lusa e as comunidades de língua oficial portuguesa, no processo de captação de investidores estrangeiros e, em suma, na maneira como o país se afirmou no mundo. Esta lista foi publicada a 4 de setembro de 2020, antes do primeiro fim de semana do nono mês do ano. Retomando a iniciativa a partir do último fim de semana de setembro, mas agora alargada a 30 personalidades, o JE publicará, todos os sábados e domingos, textos sobre as 30 personalidades selecionadas, por ordem decrescente. Aos 25 nomes inicialmente publicados, o JE acrescenta agora os nomes de António Ramalho Eanes, António Guterres, Pedro Queiroz Pereira, Vasco de Mello e Rui Nabeiro.

Cumpre explicar ao leitor que a metodologia seguida foi orientada por critérios jornalísticos, sem privilegiar as personalidades eminentemente políticas, que tendem a ter um destaque mediático maior do que o que é dado aos empresários, aos economistas, aos gestores e aos juristas, mas também sem ignorar os políticos que foram determinantes na sociedade durante o último quarto de século. Também não foram ignoradas as personalidades que, tendo falecido pouco antes de 1995, não deixaram de ter impacto económico, social, cultural, científico e político até 2020, como é o caso de José Azeredo Perdigão e da obra que construiu durante toda a sua longa vida – a Fundação Calouste Gulbenkian.

O ranking é iniciado pelos líderes históricos de cinco grupos empresariais portugueses, com Alexandre Soares dos Santos em primeiro lugar, distinguido como grande empregador na área da distribuição alimentar, e por ter fomentado a internacionalização do seu grupo em geografias como a Polónia – com a marca “Biedronka” (Joaninha) – e a Colômbia. Assegurou igualmente a passagem de testemunho ao seu filho Pedro Soares dos Santos. O Grupo Jerónimo Martins tem vindo a incentivar a utilização de recursos marinhos, pelo aumento da produção portuguesa de aquacultura no mar da Madeira – apesar de vários economistas terem destacado a importância da plataforma marítima portuguesa como fonte de riqueza, poucos empresários têm apoiado projetos nesta área, sendo o grupo liderado por Soares dos Santos um dos casos que não descurou o potencial do mar português.

Segue-se em 2º lugar Américo Amorim, que além do seu império da cortiça – o único sector em que Portugal conquistou a liderança mundial –, se destacou no mundo da energia e nos petróleos, assegurando a continuidade do controlo familiar dos seus negócios através das suas filhas. Belmiro de Azevedo aparece em terceiro lugar, consolidando a atividade da sua Sonae, bem como a participação no competitivo mundo das telecomunicações e o desenvolvimento do seu grupo de distribuição alimentar, com testemunho passado à sua filha, Cláudia Azevedo.

Em quatro lugar está António Champalimaud e a obra que o “capitão da indústria” deixou, na consolidação bancária, enquanto acionista do Grupo Santander – um dos maiores da Europa –, mas também ao nível da investigação desenvolvida na área da saúde, na Fundação Champalimaud. Em quinto lugar surge Francisco Pinto Balsemão que centrou a sua vida empresarial na construção de um grupo de comunicação com plataformas integradas e posições sólidas na liderança da imprensa e da televisão durante o último quarto de século.

Os políticos aparecem entre as individualidades seguintes, liderados por Mário Soares (que surge em 6º lugar). António Ramalho Eanes está em 7º lugar, António Guterres em 8º, seguindo-se Marcelo Rebelo de Sousa (9º), António Costa (10º), José Eduardo dos Santos (11º) – pelo peso que os elementos da sua família tiveram na economia portuguesa, sobretudo a sua filha Isabel dos Santos, e pelos investimentos concretizados em Portugal pelo conjunto de políticos e empresários angolanos próximos ao ex-presidente de Angola, atualmente questionados, na sua maioria, pela justiça angolana – e Aníbal Cavaco Silva (12º). Jorge Sampaio surge em 13º, seguido por Mário Centeno (14º), José de Azeredo Perdigão (15º), António Luciano de Sousa Franco (16º), Pedro Passos Coelho (17º), Álvaro Cunhal (18º), Ernesto Melo Antunes (19º), Luís Mira Amaral (20º), Pedro Queiroz Pereira (21º), Vasco de Mello (22º), Ricardo Salgado (23º), José Socrates (24º), Ernâni Rodrigues Lopes (25º), Francisco Murteira Nabo (26º), Rui Nabeiro (27º), Leonor Beleza (28º), António Arnaut (29º) e Joana de Barros Baptista (30º).

Copyright © Jornal Económico. Todos os direitos reservados.