Nas últimas semanas os olhares têm estado postos em Joe Berardo e Luís Filipe Vieira, numa tentativa de mostrar ao país que ninguém é intocável perante a justiça.

Sem saber o desfecho de tais processos, é certo que somos todos iguais, mas uns são mais iguais do que outros. Enquanto uns são intocáveis, outros têm pago as crises económicas do país e o buraco financeiro deixado por um dos maiores crimes de colarinho branco que o país conhece. E para além de uma fatura que parece não ter fim, as repercussões manifestam-se na perda de rendimentos e de postos de trabalho.

Recentemente, centenas de trabalhadores e suas famílias perderam, ou estão na iminência de perder, toda a sua estabilidade económica em resultado de processos de despedimento coletivo. Há duas semanas a Altice anunciou o despedimento de 232 trabalhadores e, na semana passada, a TAP seguiu o mesmo trilho e iniciou um processo de despedimento coletivo que afetará pelo menos 124 trabalhadores mas também, de forma indireta, as suas famílias.

Diz a TAP que 124 trabalhadores não é nada comparado aos cerca de dois mil colaboradores que se estimava em fevereiro virem a ser abrangidos pelo Plano de Reestruturação, ou seja, menos 94% do que o previsto. Mas os restantes 6% não são meros números: são pessoas, são famílias, são situações sociais e económicas precárias que se criam.

É incompreensível a forma como estas pessoas foram dispensadas ainda que a lei laboral assim o permita. Mais, em alguns destes casos, os trabalhadores despedidos foram substituídos por trabalhadores em regime de outsourcing, o que constitui um atropelo à lei ao qual a ACT se tem mostrado aparentemente indiferente.

Este tsunami de despedimentos coletivos não terá fim à vista se não se tomarem as medidas de proteção social necessárias para garantir não só que os trabalhadores recebem a indemnização que vai assegurar a sua subsistência, mas também que o facto de receberem essa indemnização não os impeça de impugnar judicialmente o seu despedimento.

As repercussões económicas resultantes da crise sanitária são mais do que muitas, principalmente em setores como o turismo e a aviação. A indústria da aviação está a operar a cerca de 50% comparando com os níveis de 2019, níveis esses que não se prevê que regressem em menos de três ou quatro anos. Mas nada justifica a política intimidatória e persecutória no caso da TAP neste processo, que não poupou trabalhadores com doença oncológica ou mulheres que foram mães recentemente (aliás, mais de metade das pessoas notificadas são mulheres).

O Governo deve agir já para que este despedimento coletivo seja interrompido e para que não se olhe para trabalhadores como se de números de tratassem.