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PGR suspende directiva polémica e pede parecer complementar

A Procuradora-Geral da República decidiu solicitar parecer complementar ao Conselho Consultivo versando o regime de acesso ao registo escrito de decisões proferidas no interior da relação de subordinação hierárquica.
  • Miguel A. Lopes/Lusa
11 Fevereiro 2020, 10h41

A Procuradora-Geral da República (PGR) revelou hoje que vai pedir um parecer complementar ao Conselho Consultivo sobre a polémica diretiva que reforça os poderes da hierarquia sobre a autonomia dos procuradores. E sinaliza que vai suspender a sua publicação em Diário da República até que seja emitido o parecer complementar sobre regime de acesso ao registo escrito de decisões proferidas no interior da relação de subordinação hierárquica.

“A Procuradora-Geral da República decidiu solicitar parecer complementar ao Conselho Consultivo versando o regime de acesso ao registo escrito de decisões proferidas no interior da relação de subordinação hierárquica”, avança a PGR nesta terça-feira, 11 de fevereiro. Em comunicado dá ainda conta de que “decidiu suspender a publicação em Diário da República da Diretiva nº. 1/2020, até que o Conselho Consultivo emita o citado parecer complementar”.

A decisão da PGR é anunciada no dia em que se realiza uma reunião do Conselho Superior do Ministério Público (CSMP) que, segundo fontes próximas ao processo, quer ouvir a Procuradora Geral, Lucília Gago, sobre o  facto de não ter colocado o parecer do Conselho Consultivo em discussão no CSMP antes de o ter transformado  em directiva que reforça os poderes da hierarquia sobre a autonomia dos procuradores.

Recorde-se que o pedido de parecer ao Conselho Consultivo sobre o conflito entre autonomia e hierarquia dos magistrados do MP tinha sido proposto pelo Conselho Superior à procuradora-geral da República, razão pela qual alguns membros entendem que Lucília Gago deveria ter discutido o teor do parecer com o CSMP antes de o transformar numa orientação.

O conflito entre autonomia e hierarquia do MP foi um assunto que motivou críticas do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), a propósito da investigação ao furto e achamento das armas furtadas em Tancos.

Na investigação do caso de Tancos, os procuradores quiseram ouvir o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, e o primeiro-ministro, António Costa, sobre os factos que envolvem a Polícia Judiciária Militar na recuperação das armas furtadas, mas o diretor do Departamento Central de Investigação e Ação Penal, Albano Pinto, e a procuradora-geral da República opuseram-se, no que foi visto como um conflito entre a autonomia dos procuradores e a obediência à hierarquia.

SMMP quer impugnar nova diretiva

Na semana passada, o SMMP anunciou que vai impugnar judicialmente a diretiva da PGR sobre a intervenção da hierarquia em processos judiciais e exigir, por abaixo-assinado, que Lucília Gago revogue a orientação. O SMMP considera que a directiva agora suspensa transforma os magistrados em “marionetas” e aniquila o sistema de processo penal democrático.

O parecer do Conselho Consultivo da PGR determina que a hierarquia do MP pode intervir nos processos-crime, “modificando ou revogando decisões anteriores”.

Segundo o parecer, nos processos-crime a intervenção da hierarquia e o exercício dos poderes de direção do MP não se circunscrevem ao que está previsto no Código de Processo Penal, “compreendendo ainda o poder de direção através da emissão de diretivas, ordens e instruções, gerais ou concretas”.

O parecer, além de concluir pela possibilidade de a hierarquia modificar ou revogar atos praticados pelos procuradores titulares do processo, determina que esta intervenção da chefia não figura nos autos do processo, o que, no entender do presidente do SMMP, “oculta” quem toma as decisões e viola o princípio do processo penal relativamente à transparência que deve presidir à atuação do Ministério Público, no tratamento dos atos processuais.

Também o ex-presidente do Sindicato dos Magistrados do MP Rui Cardoso manifestou nas redes sociais a sua indignação pessoal pelo teor do parecer e correspondente diretiva ao afirmar que a data daquela decisão (4 de fevereiro de 2020) foi “o dia mais negro da história democrática do MP português”, pois “morreu como magistratura”.

Em contrapartida, acrescentou, “nasceu uma verdadeira autocracia, com um nível de hierarquia que nem na Administração Pública existe”.

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