Eis-nos perante uma situação económica e social de enorme gravidade. A situação pandémica que hoje vivemos, trouxe à tona um conjunto de fragilidades da nossa opção de desenvolvimento económico e social. E o pior ainda está para vir, se não houver uma intervenção pública nos curto e médio prazos.

Uma economia fortemente dependente da dinâmica do turismo, das exportações, exíguas na sua diversidade de mercados, com uma indústria quase que residual, assente numa estrutura produtiva de pequenas e médias empresas com insuficiente capitalização e capacitação sofrível dos seus gestores, com problemas de financiamento do investimento, não passará por esta crise sem sofrimento.

Para além das responsabilidades imputadas a nós próprios, enquanto economia e sociedade, não podem deixar de se salientar as consequências do processo de globalização das últimas décadas, assente no primado das vantagens competitivas baseadas em baixos custos de produção, que acentuou a nossa dependência em relação ao exterior.

É necessária uma visão estratégica que contemple um conjunto de objetivos que permitam um desenvolvimento harmonioso e sustentável da economia portuguesa, que garanta a maximização do bem-estar social e uma distribuição do rendimento gerado mais equitativa.

O Plano de Recuperação Económica e Social de Portugal 2020-2030 de António Costa Silva, recentemente divulgado, formaliza de forma sistematizada um conjunto de eixos estratégicos que abarcam praticamente tudo, desde o fortalecimento da rede de infraestruturas, à qualificação dos portugueses, à transição para o digital, ao aproveitamento das oportunidades no setor da saúde, passando pelo setor social, até à reindustrialização, à transição energética e à eletrificação de economia. O potencial é imenso, tenhamos nós a capacidade de o materializar económica e socialmente em prol dos portugueses.

Se de um ponto de vista teórico, e até de senso comum, é fácil fundamentar a importância destes eixos, de um ponto de vista prático, muito há a considerar. Mas, reconheça-se, não ter sido o propósito deste trabalho abordar as questões ligadas à implementação destas orientações.

Se parte das atividades inerentes ao planeamento estratégico são contempladas no documento, outras há que merecem desenvolvimento posterior, nomeadamente a identificação/escolha das prioridades, o estabelecimento de programas para responder aos problemas identificados como prioritários, a elaboração de planos de ação que contemplem a definição e mensuração dos objetivos operacionais que concorrem para o atingir dos objetivos estratégicos, a contabilização dos recursos necessários, a definição de prazos para a implementação do plano e para atingir os seus objetivos, a definição de responsabilidades e o estabelecimento de métodos de monitorização e avaliação.

Qualquer manual de gestão estratégica elenca a disponibilidade de recursos como uma forte condicionante ao sucesso na implementação da estratégia, daí que, o estabelecimento de objetivos prioritários deva ser acompanhado da quantificação de recursos necessários à implementação dos planos de ação que os permitem alcançar.

Não tendo a margem de atuação que têm os países do centro e norte da Europa, os decisores públicos portugueses poderão contar com os financiamentos comunitários de 15,3 mil milhões no âmbito do Fundo de Recuperação e cerca de 30 mil milhões ao Quadro Financeiro Plurianual para 2021. Em termos orçamentais a margem é muito reduzida. O desafio da distribuição dos fundos à economia é imenso. Friso, é fundamental uma identificação clara das prioridades, num contexto de escassez de recursos financeiros. Não se pode fazer tudo ao mesmo tempo, sob pena de pouco se alcançar.

É indispensável que se garanta que os recursos são canalizados para os projetos mais rentáveis, para as empresas mais competitivas, mas é também crucial que a administração pública se prepare para a execução total dos dinheiros comunitários, o que requer agilidade nos processos, transparência e clareza no acesso a esses fundos.

Deverão ser centrais, estas preocupações, as quais poderão ser traduzidas na criação de uma entidade para a gestão do bolo financeiro disponível. Os recursos certamente não serão suficientes, mas as oportunidades existem e não devem ser desperdiçadas.