Os contribuintes portugueses têm, nos últimos anos, sido chamados a financiar, com o dinheiro dos seus impostos, um conjunto de empresas que, por esta ou por aquela razão, o Estado decidiu não deixar cair.

Não estamos aqui a defender que o Estado deveria ter deixado ao abandono estas empresas, entregando-as à sua sorte, sem lhes colocar a mão por baixo, até porque, nalguns casos, isso teria um custo difícil de estimar pelo efeito de arrastamento que poderia acarretar, mas, tão-só, que os contribuintes têm, de há uns anos a esta parte, canalizado uma parte significativa dos seus impostos para o pagamento das dívidas acumuladas pela implosão do BPN, pelo desaparecimento do BES e manutenção do seu sucessor Novo Banco, que, ao contrário do que nos foi prometido, nada tem de Bom, esperando-se que o façam agora, também, para financiar o plano de recuperação da TAP, isto para já não falar do que nos é anualmente tirado do bolso para financiar as Parcerias Público-Privadas (as célebres PPP).

O que não se poderia ter feito para desenvolver a economia portuguesa se os contribuintes não tivessem suportado a pesada fatura de 6,2 mil milhões de euros do BPN, a enorme conta de 3,9 mil milhões de euros que nos tem vindo a ser apresentada pelo Novo Banco, preparando-se, agora, para destinar entre 3,7 e 7 mil milhões de euros para salvar uma empresa que apresentou nos últimos 10 anos prejuízos acumulados de 640 milhões de euros e que este ano, fruto da pandemia, irá, num só ano, apresentar prejuízos entre os 800 e os 1.000 milhões de euros.

Se a isto acrescentarmos os 1.000 milhões de euros que anualmente suportamos em relação às PPP, algumas das quais ruinosas, temos a explicação para Portugal, um dos países mais pobres da União Europeia, ter uma das cargas fiscais mais elevadas no panorama internacional.

O que de uma vez por todas se pede é um governo que tenha a coragem de saber definir quais as verdadeiras funções que o Estado deve desempenhar e que devem ser financiadas pelos nossos impostos. A segurança, a saúde e a educação são apostas inequívocas, que poucos conseguem questionar, apesar de se poder discutir qual a verdadeira extensão que o Estado deve ter mesmo nestas áreas e qual o papel que os privados nelas deverão assumir.

Tempos houve, após a revolução de abril de 74, em que o manto do Estado quase tudo cobria, indo da área financeira, às telecomunicações, à energia, à siderurgia e por aí adiante. Depois, vieram as privatizações e, progressivamente, os setores começaram a ser abertos à iniciativa privada, embora, nalguns casos, em concorrência com o Estado.

Hoje, são várias as situações em que pode questionar-se o interesse em ser o Estado a assumir a propriedade e o controlo de empresas em setores que noutros países mais desenvolvidos da União Europeia há muito deixaram a esfera pública.

Está na hora de perguntarmos se devemos ter uma transportadora aérea nacional financiada, ano após ano, com o dinheiro dos nossos impostos, tornando-nos acionistas involuntários da mesma, se devemos continuar a ter um banco público, que concorra com os privados, sem que se perceba, na esmagadora maioria das situações, qual a mais-valia desta opção, se os transportes públicos deverão continuar a ser geridos pelo Estado ou pelos municípios, ou se se deve optar pelo regime da concessão, normalmente capaz de assegurar resultados mais positivos, fruto de uma gestão mais profissional.

Claro que os que ideologicamente defendem a imagem do Estado-Polvo, que estende os seus tentáculos a todos os setores, sempre advogarão a importância estratégica do Estado estar presente em todas as áreas, embora nunca sejam capazes de definir de forma objetiva em que consiste esse interesse estratégico, nem de aceitar que em muitas áreas o Estado não deve estar presente, a não ser, eventualmente, no papel de regulador.

Enquanto não houver coragem de fazer um catálogo das áreas em que o Estado deve atuar como produtor, aquelas em que deve ser mero regulador e aquelas em que se deve, pura e simplesmente, abster de intervir, enquanto não se apontarem limites qualitativos e quantitativos para a atuação do Estado, os pobres contribuintes, ou seja, todos nós, continuaremos a participar nestes festins capazes de, ano após ano, nos sugarem o dinheiro resultante do nosso trabalho e das nossas poupanças, por via dos impostos altíssimos que suportamos.