Continuamos a ser das sociedades mais desiguais e com mais elevado risco de pobreza na Europa. O atual Governo orgulha-se de ter reposto rendimentos e descongelado pensões, mas o fosso entre ricos e pobres não abrandou desde que tomou posse.

A solução não passa exclusivamente pelo crescimento económico gerador de emprego como querem fazer crer aqueles que, no Governo ou na oposição, se mostram sensíveis ao tema. Sem uma estratégia conducente à defesa intransigente de um personalismo assente na dignidade da pessoa humana não vamos conseguir combater a pobreza de frente e, sejamos realistas, não há vontade política para a concretizar.

Defender os pobres, através do combate à precariedade laboral e do aumento do salário mínimo é importante, mas a prioridade não é essa. A prioridade é defender os mais pobres dos pobres, aqueles que pela idade ou condição física já nem podem trabalhar para sobreviver. Se esperarmos pela eficácia no avanço das estratégias macroeconómicas arriscamo-nos a que ela não chegue àqueles que entretanto já sucumbiram ou cujas condições de vida resultaram numa recuperação inviável.

O clássico desprezo dos poderes institucionais e das forças políticas pelos mais pobres dos pobres tem uma explicação: a pobreza não rende votos, até porque estamos a falar, na maioria dos casos, de crianças e de idosos que nem sequer exercem esse direito. Quando é que Portugal ouviu falar num plano aprofundado e sério sobre este tema, proposto por algum partido político da esquerda à direita? Nunca.

Subestimar esta questão torna-se perigoso, porque os exemplos de outras sociedades onde isso aconteceu levou ao crescimento do populismo, da xenofobia, do radicalismo e do crime organizado, cuja reversão se torna depois difícil. Sendo esta uma questão transversal que envolve os setores do trabalho, da habitação, da saúde, da educação, da mobilidade, torna-se urgente uma convergência entre todos os partidos políticos para que, em conjunto, se reúnam equipas de trabalho e, sobretudo, vontades que ponham em prática um programa global de erradicação da pobreza e da exclusão.

Enquanto se mantiver a ideia de que é possível combater este flagelo de forma pontual e dispersa, sem a adesão incondicional a um compromisso que defina uma estratégia nacional e concertada gerador de pactos de regime, não vamos conseguir resolvê-lo. Aliviar o sofrimento do pobre não chega, é preciso dar-lhe condições para sair da pobreza e o Estado deve aproveitar as fases de recuperação financeira e económica para apresentar soluções e definir caminhos.

Desde a morte de Bruto da Costa, o maior paladino deste tema em Portugal, que esta é uma questão adormecida. Urge devolvê-la à agenda política com a seriedade e a responsabilidade que se exigem.