Analisada a matéria fiscal do orçamento, dificilmente se pode concluir que o mesmo seja eleitoralista. Com efeito, mantém-se genericamente a carga fiscal sobre os portugueses, os quais pagam 23% pela luz, tanto como pelo caviar, mais 17 pontos percentuais do que pelas ostras, dez pontos percentuais mais do que uma refeição num restaurante “estrela Michelin“. Acrescenta-se o aumento muito expressivo da tributação ao financiamento do consumo (imposto do selo) mas este, como imposto indirecto, beneficia do tão útil efeito anestesiante junto dos contribuintes.

Assinala-se em sentido contrário o fim do PEC, com impacto financeiro em muitas micro e pequenas empresas. Curiosamente (não há coincidências), foi o sector dos táxis que tanto clama contra a concorrência que mais vigorosamente se manifestou contra a criação do PEC, nos idos de 1998.

Se do lado da receita não parece haver eleitoralismo, que dizer das opções do lado da despesa? Tomando por referência números saídos a público o aumento dos funcionários públicos irá custar ao erário público cerca de 750 milhões de euros. Por comparação, a redução do IVA (que, recorde-se, subiu para a taxa de 23% na sequência da catastrófica governação Sócrates) custaria cerca de 500 milhões de euros.

Aqui está feita a escolha, preferiu o Governo favorecer um grupo profissional em desfavor da maioria da população, pois antecipa (possivelmente corretamente) que um bom score eleitoral passará pela satisfação desses eleitores, sindicalmente bem representados, com grande poder reivindicativo e mediático.

Assinala-se ainda a descida anunciada das propinas do ensino superior público, medida que à primeira vista parece muito meritória, não fosse o facto de todos os contribuintes, incluindo os analfabetos, os que deixarem a escola aos 14 anos (e agora têm muito longas carreiras), a pagar com os seus impostos o custo do ensino superior público, nomeadamente os estudos de muitos alunos que em nada carecem dessa ajuda.

De positivo salienta-se a relativa estabilidade fiscal, designadamente a manutenção de benefícios fiscais que muito têm contribuído para a recuperação de sectores da economia, como é o caso do Regime dos Residentes Fiscais Não Habituais (RNH) e o benefício destinado a estimular o regresso dos jovens e técnicos emigrados nos anos mais críticos da crise.

Assim, em jeito de conclusão se dirá que o orçamento não é eleitoralista na receita, mas sim nas opções relativas à despesa. Favorecendo grupos de eleitores, dos quais se espera retribuição em forma de voto. Veremos se o crescimento previsto no orçamento (2,2%) será atingido ou se ficamos pelos 1,8% (previsto pela maioria dos analistas), o que poderá deitar tudo a perder.