A descida da inflação para 1,9% em agosto foi mais uma boa nova do INE, anunciada com alarido na comunicação social. Entretanto, o Banco Central Europeu (BCE) avançou com a previsão de 2,2% para a zona euro.

Os valores atuais aproximam-se do objetivo de política definido pelo BCE, alimentando a esperança de que a breve trecho as taxas de juro possam continuar a descer.

Pouco antes de serem conhecidas as estimativas para a inflação em Portugal, do outro lado do Atlântico, no retiro de Jackson Hole, os sábios discutiam o futuro da política monetária. O importante encontro juntou mais uma vez economistas, governadores de bancos centrais e decisores de política económica, desta feita para debaterem a eficácia da política monetária e seus mecanismos de transmissão.

No seu discurso de abertura, Jerome Powell, o presidente da Reserva Federal americana (Fed), referiu antever a possibilidade de começar a descer a taxa de juro de referência. Isto porque já terá sido alcançado o objetivo de ancorar as expectativas da inflação – a confiança da população na capacidade de o banco central levar a inflação para os 2%, o objetivo de política monetária, foi finalmente restabelecida.

Segundo Powell, o sucesso desta ancoragem resultou da política monetária adotada pela Fed nos últimos dois anos. A política foi tão perfeita que o ajustamento se fez sem mácula no mercado de trabalho, entenda-se sem gerar desemprego.

A espiral inflação-salários – a repetição insistente da ideia de que tolerar uma subida de salários que permitisse recuperar, ainda que parcialmente, o poder de compra prejudicaria o controlo da inflação – é subtilmente esquecida no discurso.

Como também não há uma referência à subida estrondosa de lucros pelas grandes empresas, que foi tolerada enquanto se exigia à população a contenção de salários para impedir o aumento de preços.

Que alterações estruturais, na economia em geral e no mercado de trabalho em particular, resultarão da combinação de salários baixos e lucros altos é a pergunta que ainda está por responder.

Para Powell pouco importa, visto que o grande desiderato está cumprido. A inflação foi providencial, permitindo-lhe recuperar o mecanismo tradicional da política monetária – a manipulação da taxa de juro e sua transmissão para economia, quiçá o objetivo último da política dos últimos dois anos.

O período das taxas de juro reais negativas pode estar definitivamente ultrapassado. É a bonança que sucede a tempestade. Esperemos que o presidente da Fed tenha razão.