O motorista da Uber aproveita a viagem pela cidade para contar as novidades. Quinta-feira estava convocada uma manifestação dos taxistas em Lisboa. O protesto, designado “Desfile do Descontentamento”, previa uma marcha a pé, com início no Parque Eduardo VII e uma vigília à porta da Procuradoria Geral da República (PGR).

A concentração, desta vez sem carros para evitar serem barrados na rotunda do aeroporto como na última manifestação, contava com o apoio de familiares e simpatizantes da causa, numa caminhada em paralelo da Avenida da Liberdade à PGR. Objectivo? Paralisar a capital.

Confesso que não vi nas notícias nem nas redes sociais a tal convocação paralela dos familiares e simpatizantes, soube pelo motorista da Uber, ao qual informei que a manifestação tinha sido desconvocada depois de, na última sexta-feira, a Federação Portuguesa do Táxi e a Associação Nacional dos Transportes Rodoviários em Automóveis Ligeiros, terem sido chamados para uma reunião com a Procuradora-Geral da República, Joana Marques Vidal.

O condutor da Uber ficou desiludido, perdeu uma oportunidade de trabalhar e ganhar o dobro esta semana. É que cada vez que os táxis se manifestam, o descontentamento da população com o sector cresce e novas empresas como a Uber, Cabify e Taxify têm dias de trabalho intenso. Calcula-se que na última manifestação o download da aplicação da Uber aumentou 400%. Para isso muito contribui uma péssima gestão de imagem das empresas representantes dos táxis, um sector profissional que não teve concorrência durante décadas e que, devido a isso, acumulou muitos vícios e prepotência no tratamento dos clientes e nos valores praticados.

Há uma semana, o Presidente da República declarou no XII Encontro da COTEC Europa em Mafra: “Não podemos querer uma economia 4.0 com políticos 2.0.” Marcelo classificou os actuais sistemas políticos, “desenhados para a Europa e para o mundo nos anos 70 e 90 do século passado, se não antes”, de “estruturas rígidas, distanciadas e afastadas dos povos”. Tem razão. Tal como a classe dos taxistas, que não soube adaptar-se aos novos tempos e exigências laborais, a classe política nacional estagnou numa época em que não sofriam contestação nem concorrência, tornando-se refém das suas próprias limitações.

Mas, apesar da mudança ser inevitável, a classe política não optou por se modernizar e fazer face às novas exigências. Antes preferiu lutar para manter e aumentar velhos privilégios. Exemplo cabal disso foi a recente tentativa de financiamento dos partidos, concertada e apoiada por todos os partidos no Parlamento (excepto CDS e PAN), onde a cereja no topo era a devolução de IVA, tal como uma bandeirada sem limites no valor.

Para quando a concorrência política em prol de uma sociedade mais livre e justa?

A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.