Aquele que é, na minha opinião, um dos mais geniais poetas contemporâneos nacionais, escreveu um dia: “Sinto-me à frente de gente que tem como influência uma só referência, uma só canção, são imitação da escrita que limita a direção”.

As referências intelectuais e as barreiras ideológicas de esquerda e direita criam bloqueios facciosos à criatividade necessária para enfrentar aquilo que é novo.

Por vezes, talvez vezes demais, sinto que a classe política se reveza num inconsequente karaoke onde os clássicos de outrora são repetidos incansavelmente.

É, nos versos do referido poeta, que encontro a inspiração para as reflexões que gostava de ver preconizadas no pensamento dos nossos agentes políticos:

1. “Corte e costura, sorte e postura, também ser forte na mistura, para tentar juntar dois mundos opostos.”

Será que, do cruzamento das diferenças ideológicas e sensibilidades aparentemente binárias, não encontramos um cinzento melhor que o preto e o branco?

Entendimento não é condescendência.

2. “Não percebes nada, preferes uma balada, bem elaborada, por alguém conceituado.”

Será que, na procura de inspiração noutras referências políticas e até de outras naturezas, não encontraremos também nós o espaço para apropriar novas ideias?

Humildade intelectual não é fraqueza.

3. “Marvila é vida, é a vinha que eu engarrafo, estou na minha, eu nunca sigo a mesma linha, eu paragráfo.”

Será que mudar as lentes com que olhamos para os problemas, não nos permitirá encontrar aquilo que se esconde do nosso olhar?

Criatividade não é estupidez.

Tenho poucas dúvidas que o desafio que nos é colocado irá culminar em novos modelos de sociedade. Aquilo que é novo exige novidade e pensamento divergente.

É fundamental anteciparmos a discussão sobre o modelo de sociedade que queremos depois desta descontinuidade, porque um dia é muito tempo, quando tem um talvez atrás”.

P.S. Os versos são do “poeta do povo”, Samuel Mira, conhecido como Sam the Kid e, talvez num país com outras referências, fosse objeto de estudo em manuais de língua portuguesa.