A 5 de janeiro deste ano, uma mulher foi morta pelo companheiro com arma de fogo na sua casa, em Lagoa. A 7 de janeiro, na ilha Terceira, uma mulher foi morta por espancamento pelo seu cunhado. A 11 de janeiro, em Almada, uma mulher morreu, vítima de espancamento, o corpo quase irreconhecível pelas marcas de agressão. Nessa data, no Alandroal, um homem matou a mulher e a sua irmã, ambas octogenárias. A 17 de janeiro, em Oeiras, um homem matou a mulher de 72 anos. A 27 de janeiro,  em Santarém, uma mulher foi espancada, degolada e deixada a morrer na sua casa. A 31 de janeiro, uma mulher de 25 anos foi morta por um homem com quem tinha um relacionamento amoroso. A 4 fevereiro, no Seixal, uma mulher de 60 anos foi morta à facada pelo seu genro. A sua neta de dois anos foi asfixiada pelo mesmo homicida.

Nove casos de mulheres que foram alvo de violência de género em contexto de família, um número que aumentou em comparação com período homólogo de 2018.

Há cerca de um ano, na sequência do homicídio da minha prima Nadia, de 22 anos, que foi brutalmente assassinada pelo ex-namorado no Canadá, coloquei uma série de questões relevantes que volto aqui a transcrever. “O que pode ser feito para prevenir a violência de género, independentemente do contexto cultural? Como se devem aconselhar jovens mulheres a sair de relações perigosas sem colocar em perigo as suas vidas? Estará a legislação a ser melhorada para fazer frente a estas situações?”.

As questões irrompem sempre que a comunicação social noticia mais um caso trágico de assassinato de mulheres em família. O caso recente do duplo homicídio no Seixal expôs, mais uma vez, a fragilidade dos meios de proteção concedidos, seja pela polícia, Ministério Público (MP) ou tribunais. Apesar dos alertas da PSP, o caso de Seixal acabou por ser classificado como sendo de “ameaça e coação”.

Tivesse o caso sido registado como violência doméstica (crime público) e o MP teria prosseguido com a acusação. Mais relevantes ainda são estes números: apenas 15% dos casos encerrados em 2017 resultaram numa acusação do MP, sendo que os restantes 85% não chegaram aos tribunais (fonte: Público). É caso para dizer que o MP se  revela incapaz de aplicar a legislação e de identificar o nível de risco associado a cada denúncia. São falhas que se traduzem na perda de vidas.

A denúncia por uma mulher (ou familiar) é um ato de grande coragem e sofrimento e não pode esbarrar numa atuação descoordenada por parte dos serviços do Estado e num muro técnico-legal que rebaixa e desvaloriza esse ato.

É verdade que o Estado não pode salvar as mulheres de todas as desgraças familiares, mas as entidades do Estado podem – e devem – garantir um enquadramento psicológico, social e legal que permita que as queixas sejam tratadas de uma forma muito mais eficaz do que têm vindo a ser, o que torna essencial conferir uma maior proteção às vítimas.

O recente aumento de casos,  bem como a sua violência, fez soar os alarmes. As portas fechadas que têm ocultado estas situações têm de ser abertas ou mesmo arrancadas das suas dobradiças, se necessário.