O mundo mudou e continuará a mudar a uma velocidade vertiginosa.

Vivemos num tempo em que a incerteza passou a ser o novo normal: crises geopolíticas, desafios ambientais, disrupções tecnológicas, pressões demográficas, transformações sociais profundas e novos cenários políticos desafiam os alicerces das nossas economias, instituições e modelos de vida. Governar hoje é navegar em terreno movediço, onde planos de quatro anos parecem envelhecer em quatro meses.

Nos últimos 25 anos, Portugal consolidou a democracia, modernizou infraestruturas, qualificou a sua população e integrou-se plenamente na União Europeia. No entanto, manteve desafios estruturais persistentes: baixo crescimento económico, fraca produtividade, dependência de fundos externos, desigualdades sociais e um modelo de desenvolvimento pouco preparado para enfrentar disrupções tecnológicas, transições climáticas e transformações demográficas. O país avançou, mas precisa agora de reinventar-se para os próximos 25 anos.

Num contexto assim, e agora que saímos das quartas eleições legislativas em seis anos, Portugal precisa de mais do que respostas imediatas: precisa de visão! E por isso acredito que este é o momento para que, no novo Governo, tenhamos uma Ministra do Futuro.

A instabilidade, ambiguidade e volatilidade do mundo atual não se enfrentam apenas com políticas reativas. Exigem capacidade estratégica, antecipação e inovação. No entanto, a estrutura governativa portuguesa tradicional continua presa a uma lógica de ministérios funcionalmente definidos por áreas tradicionais: saúde, educação, finanças, economia, etc., como se os grandes desafios de futuro não estivessem interligados e não precisassem de coordenação multidisciplinar.

O papel da Ministra do Futuro não deveria ser meramente simbólico. Deveria liderar uma estratégia nacional de inovação, prospetiva e de transformação. Seria responsável por coordenar políticas interministeriais para enfrentar desafios transversais: a transição energética, o impacto da inteligência artificial no emprego, a transformação demográfica, a segurança alimentar, os cuidados de saúde universais, a reinvenção da educação, a sustentabilidade da proteção social ou uma estratégia clara de habitação.

Esta Ministra não substituiria os restantes ministros. Pelo contrário, complementá-los-ia, desafiando-os a pensar e agir com visão de futuro. Seria a guardiã da capacidade de imaginar, experimentar e transformar, coordenando políticas para o que ainda está por vir. Para construirmos futuros desejáveis para Portugal – em vez de apenas reagirmos aos indesejáveis.

Nesse papel, identifico cinco missões fundamentais:

  1. Liderar a Estratégia Nacional de Futuro e Inovação: Uma estratégia supraministerial que defina prioridades de longo prazo para o país, com metas claras para 2030, 2040 e 2050, articulando políticas públicas, ciência, empresas e sociedade civil.
  2. Coordenar o Gabinete de ‘Foresight’ e Transformação: Um centro de inteligência estratégica, capaz de antecipar cenários, testar políticas com simulações e produzir conhecimento útil para decisões de governo com base em dados, evidência e participação cidadã.
  3. Promover a Inovação na Administração Pública: Lançar programas de inovação pública, experimentar novas formas de prestação de serviços e incorporar tecnologia de forma ética e eficaz, sem perder de vista o valor público.
  4. Criar o Orçamento do Futuro: Uma fatia do Orçamento de Estado dedicada a projetos transformadores, com retorno esperado a médio e longo prazo, incluindo investimentos em inovação social, transição digital, cidades inteligentes ou capacitação intergeracional.
  5. Mobilizar o país para um pacto intergeracional: Envolver jovens, cientistas, empreendedores, autarcas e decisores políticos num compromisso coletivo com o futuro. Um país só progride se conseguir imaginar em conjunto o que quer ser.

Se pensa que isto é uma bizarria, a verdade é que outros países já o perceberam. A Finlândia tem um Committee for the Future no parlamento. Singapura criou um Centre for Strategic Futures ligado ao primeiro-ministro. A Escócia tem um Chief Futurist. A Nova Zelândia adotou um Wellbeing Budget centrado em impactos de longo prazo.

Numa legislatura marcada por expectativas renovadas e exigência social crescente, é tempo de dar este passo corajoso: uma Ministra do Futuro com mandato claro para garantir que inovação, foresight e pensamento estratégico não sejam apenas discursos em conferências, mas prática estruturante da governação. Não se trata de adivinhar o futuro, mas de preparar o país para múltiplos futuros possíveis e desejáveis. De garantir que Portugal não apenas sobrevive às próximas crises, mas que as transforma em oportunidades de renovação, crescimento e liderança global.

A história julga os povos e as nações não pelo que fazem com o passado, mas pelo que ousam imaginar para o futuro. Estará Portugal pronto para construir o seu próximo legado?