“A mudança é a lei da vida. Aqueles que olham apenas para o passado ou o presente certamente perderão o futuro.” – John F. Kennedy

Vivemos num momento decisivo para os sistemas de saúde mundiais, com profundas alterações demográficas, maior prevalência de doenças crónicas, maior consumo de cuidados de saúde ao longo da vida, maior exigência dos utentes, crescentes gastos em inovação e crises pandémicas globais. Estes fatores colocam fortes pressões sobre a organização e financiamento dos sistemas de saúde, expondo as suas atuais fragilidades.

A incapacidade ou reação tardia a estes desafios poderá comprometer seriamente a capacidade de resposta e a sustentabilidade de longo-prazo dos sistemas de saúde. Desta forma, muitos têm sido em anos recentes os esforços de reforma dos sistemas de saúde no mundo, visando reforçar o nível de acesso das populações, a eficiência operacional, a adaptabilidade, a qualidade dos cuidados prestados e, sobretudo, a sustentabilidade e resiliência financeira.

Foi neste quadro que, no passado dia 30 de junho de 2020, apresentei publicamente o “Estudo sobre a Organização e Financiamento do Sistema de Saúde em Portugal”, realizado pela EY-Parthenon e pelo ISEG para o Health Cluster Portugal (HCP). Este estudo, que se baseou numa análise do atual sistema de saúde português e num processo de benchmarking internacional, apresenta um conjunto alargado de orientações para a melhoria e reforma da organização e financiamento do sistema de saúde português, enquadrado em quatro vetores centrais:

n Maximização da utilização de todos os recursos disponíveis no sistema nacional de saúde, sejam públicos, privados ou sociais, procurando com isso reforçar a eficiência do sistema de saúde como um todo através de um melhor aproveitamento da capacidade instalada, de uma maior articulação entre todos os agentes e de uma reorganização da “rede” em torno do conceito de cuidados integrados;
n Separação, na esfera do Estado, da “função financiamento” e da “função prestação de serviços”, promovendo a gestão profissional em ambas e a redução das sobreposições existentes no atual modelo de governação da saúde no país, conferindo maior autonomia e responsabilização aos agentes e alinhando os diversos interesses no sentido da melhoria da performance global do sistema de saúde;
n Minimização das restrições de acesso dos cidadãos a cuidados de saúde de elevada qualidade, independentemente dos recursos ou da natureza jurídica dos financiadores ou prestadores, colocando o paciente no centro do sistema e concretizando elementos de liberdade de escolha enquanto mecanismo estruturante do mesmo, bem como instrumento de cidadania e participação que reforçe a responsabilização, qualidade e eficiência do sistema de saúde.
n Adoção de uma visão económica da saúde, reconhecendo não apenas a importância direta que os cuidados de saúde têm no emprego, no rendimento e em muitas outras variáveis económicas e sociais, mas também a relevância indireta que lhe está associada no quadro da cadeia de valor como um todo, quer a montante (nas suas indústrias “fornecedoras”, como é o caso da indústria farmacêutica, dos dispositivos médicos ou dos meios complementares de diagnóstico) quer a jusante (nos pacientes, ao nível da qualidade de vida e da sua produtividade) e no sistema científico-tecnológico associado, que obriga a ver a despesa em saúde como investimento e não como gasto.

Tal como em outros países, Portugal deve intensificar o processo de adaptação e modernização do sistema nacional de saúde, sob pena de colocar em risco a sua sustentabilidade e o nível de acesso das populações aos cuidados necessários.

O surgimento da pandemia Covid-19 e o respetivo impacto veio evidenciar de forma ainda mais assertiva a relevância e a urgência de um sistema de saúde que seja resiliente e sustentável.