“Os tolos dizem que aprendem com os seus próprios erros; eu prefiro aprender com os erros dos outros”, Otto von Bismarck
Muito se tem escrito sobre a sucessão em empresas familiares. Mas o que tem realmente acontecido? Ao longo dos últimos dez ou vinte anos, houve dezenas de casos de sucessão – uns bem conduzidos e com resultados notáveis, mas tantos outros falhados, deixando a família e os seus negócios pior do que estavam.
Convido o leitor a “aprender com os erros dos outros” viajando por alguns exemplos reais de fracassos de sucessão de empresas portuguesas onde por pudor alterámos nomes, profissões, áreas de negócio ou número de filhos – o que torna interessante tentar adivinhar qual é cada caso realmente.
Theo Mirante construiu um império na sua área que soube sempre manter a crescer e a valorizar-se mesmo quando se debateu com um problema sério de saúde. Nunca se preocupou com a preparação ou a carreira dos filhos para a sucessão, deixou que cada um seguisse por si. Ele chegava. Agora quer que um filho lhe suceda e escolheu Teresa, a mais velha, professora de aeróbica que não quer largar a profissão, mas part time fará um favor ao Pai. Não se fala num CEO profissional, é tabu, só se fala de família. Teresa é arrogante e não sabe onde se vai meter. Ou se rodeia de profissionais competentes e leais ou é o fim da estrada para esta empresa.
A Família Bettencourt é hoje uma amálgama de ramos acionistas em guerra permanente, só a veterana Presidente Amália tem mão no Conselho. Mas a idade avança e depois de passar ao primo este passa a presidência a António, filho de Amália. Jovem e introvertido arquiteto devotado á sua profissão, sem qualquer preparação em gestão, António aceita. Não constitui uma equipa, mas delega tudo no todo-poderoso Diretor Geral do Grupo. A mãe não tinha preparação, mas bom senso e um caráter forte. António não e o mais provável é que o Diretor Geral seja o centro de gravidade do Grupo com o ordenado que quiser e a família vai brincar aos acionistas sem tocar realmente no negócio, com o pobre António a ver a banda passar.
Carlos Medeiros Guerreiro construiu um pequeno império dedicado a artigos alimentares baseados na matéria-prima de uma zona da Serra da Estrela. Carlos teve dois filhos da primeira mulher e uma menor da segunda e atual esposa – mas a sua visão de sucessão nunca passou senão por si próprio. Acredita que a sua obra não foi feita para passar aos filhos, que a segunda geração destrói a obra e tem montado barreiras ao acesso dos filhos. Estes seguirão a sua carreira e daqui a décadas a morte de Carlos será seguramente a morte da sua obra.
Sempre preocupado com a sucessão do seu império, Raul Faceiro depositou todas as esperanças no seu filho e preparou-o o melhor que pode para assumir o seu lugar. Mas o filho via o mundo duma maneira diferente, mais divertida e sem ter de assumir grandes responsabilidades. Quando Faceiro ganha consciência da sua derrota, a sua filha ampara-o e oferece o neto, seu filho. Tão novo, pensa Faceiro, tem potencial mas vou ter de o preparar e já. Falhou-se uma geração, mas emendou-se a mão com a seguinte.
Deolindo Peseiro construiu um império na área do turismo com cruzeiros, restaurantes e bares de todo o Mundo e torna-se um dos homens mais ricos de Portugal. Tem três filhos que diz serem a sua maior prioridade, mas a verdade é que trabalha intensamente apesar da idade. A realidade é que a preparação dos seus filhos para a gestão do império não está minimamente nas suas prioridades nem estes estão a construir uma carreira nesse sentido.
Quando acha que chega a altura, o empresário de hotelaria José Ramos de Almeida passa a liderança executiva ao filho André, um jovem inteligente e bem preparado que acompanhara o Pai anos na gestão da cadeia. Mas o que André não espera é a obstinação e teimosia do Pai em bloquear medidas que André acha essenciais. Não durou muito a tensão. Passado uns meses, André sai. Sem irmãos, deixa o Pai como líder executivo e perante a necessidade de contratar alguém externo quando já não aguentar mais.
Que nos dizem estes exemplos – e tantos outros que não citámos? Tomando os cinco princípios da sucessão virtuosa vemos que cada caso não cumpriu um ou mais desses princípios …
Não existiu proximidade e transparência de potenciais candidatos junto de quem decide
Não houve preparação para criar o perfil e competências necessárias ao sucessor
A seleção e o ‘grooming’ do(s) candidato(s) é inexistente
A escolha e a preparação final do sucessor
A transição da liderança é feita de forma atabalhoada sem respeito pelo espaço ou preparação do sucessor
A gestão da sucessão é um dos maiores desafios do líder de uma empresa familiar. Com o conhecimento do que é preciso, com dedicação e amor filial, o processo será seguramente um sucesso. Caso contrário, teremos mais um caso a fazer companhia a estes tristes exemplos de grandes empresas que estão a deitar tudo a perder por não gerir bem a sucessão.