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Por que foram multados 14 bancos pela Autoridade da Concorrência?

A Autoridade da Concorrência (AdC) condenou 14 bancos ao pagamento de coimas no valor global de 225 milhões de euros por prática concertada de troca de informação comercial sensível, durante um período de mais de dez anos, entre 2002 e 2013. Se foi afetado, saiba como deve proceder?
9 Setembro 2019, 18h51

De que modo o “caso da Banca” afetou os consumidores?

Os serviços bancários (designadamente, o crédito à habitação, o crédito ao consumo e o crédito às empresas) são da maior importância para os consumidores em geral, tanto particulares, como empresas, permitindo a canalização do aforro para o investimento e assegurando meios de liquidez necessária ao financiamento da atividade económica. Trata-se, assim, de uma atividade económica essencial ao bom funcionamento da economia, sendo fundamental que obedeça aos princípios e regras que visam garantir o funcionamento da concorrência livre e não falseada e maximizar o bem-estar e a confiança dos agentes económicos e dos consumidores.

Ao desvirtuar as regras da Concorrência através de uma concertação ilícita que lhes permitiu reduzir o risco e a incerteza quanto à atuação dos seus concorrentes diretos, o comportamento dos bancos em causa prejudicou a Concorrência, afetando diretamente os consumidores.

 

Qual foi o comportamento dos spreads durante a prática?

Em sentido contrário à evolução da Euribor, os spreads aplicados pelas instituições financeiras a novas operações de crédito à habitação registaram uma subida acentuada, a partir de meados de 2008.

Verifica-se que à descida abrupta da Euribor corresponde uma subida sustentada dos spreads médios, que atenua a redução da taxa de juro que decorreria da descida abrupta da Euribor.

 

 

A AdC pediu parecer ao regulador setorial? Qual foi o resultado?

Nos termos da Lei da Concorrência, sempre que a AdC emita uma decisão num setor regulado deve ser previamente emitido parecer pelo regulador setorial, neste caso, o Banco de Portugal. Estando a decisão concluída, foi comunicada ao Banco de Portugal em julho de 2019. O Banco de Portugal emitiu parecer em agosto circunscrevendo a sua análise ao potencial impacto das coimas a aplicar ao nível do cumprimento dos requisitos prudenciais a que as instituições bancárias em causa se encontram sujeitas, bem como ao eventual impacto dessas sanções sobre os respetivos resultados dos bancos e ao valor total de perda que as mesmas representariam para o sistema financeiro.

Considerou, assim, o regulador que, caso fossem determinadas pela AdC coimas que correspondessem ao montante máximo previsto no n.º 2 do artigo 69.º da Lei da Concorrência (10% do volume de negócios total), tal poderia afetar, efetivamente, e de forma material, a estabilidade financeira e a resiliência de um número significativo de instituições num cenário de recuperação do sistema bancário português.

 

A coima aplicada pode, como sugere o Banco de Portugal, afetar a estabilidade do sistema financeiro português?

Como referido anteriormente, a coima aplicada a cada banco foi calculada com base nos critérios definidos na Lei da Concorrência e nas Linhas de Orientação da Autoridade para o cálculo de coimas, tendo em conta o volume de negócios nos mercados afetados, assim se afigurando adequadas e proporcionais às infrações cometidas por cada banco. As coimas concretamente aplicadas representaram uma parcela reduzida dos volumes de negócios totais dos bancos visados.

 

Quem se responsabiliza pela coima do BES, o Novo Banco?

A responsabilidade é do BES. Nos termos da subalínea (v) da alínea b) do Anexo 2 à deliberação do Banco de Portugal, de 3 de agosto de 2014, com as clarificações e ajustamentos introduzidos pelas deliberações do Banco de Portugal, de 11 de agosto de 2014, e de 29 de dezembro de 2015, as responsabilidades do BES perante terceiros que constituam passivos ou elementos extrapatrimoniais deste, foram transferidos, na sua totalidade, para o Novo Banco, com exceção de quaisquer responsabilidades ou contingências, nomeadamente as decorrentes de fraude ou da violação de disposições ou determinações regulatórias, penais ou contraordenacionais, com exceção das contingências fiscais ativas. Acrescenta a alínea c) do Anexo 2 à deliberação de resolução do BES, que as responsabilidades do BES que não são objeto de transferência permanecerão na esfera jurídica do BES.

 

E no caso do Barclays, que foi adquirido pelo Bankinter?

Em 1 de abril de 2016, os negócios de retalho, banca privada e parte da banca corporativa do Barclays Bank em Portugal foram adquiridos pelo Grupo Bankinter, não se transferindo, no entanto, a responsabilidade pela atuação em causa no presente processo para o referido Grupo Bankinter, na medida em que o Barclays mantém personalidade jurídica e, como tal, nos termos do disposto no artigo 73.º da Lei da Concorrência, mantém a responsabilidade contraordenacional pelos factos por si praticados.

 

Existe ainda o caso do BPN, entretanto adquirido pelo BIC. Quem se responsabiliza por esta coima?

Neste caso, como a entidade visada deixou de existir, será o adquirente a responsabilizar-se pela coima.

 

Como é que a AdC detetou e investigou este caso?

A Autoridade detetou o caso através de um pedido de clemência efetuado por um dos bancos envolvidos na infração (tendo posteriormente recebido um segundo pedido de clemência).

A investigação concretizou-se, entre outras medidas, na realização de (i) diligências de busca e apreensão em 25 instalações de 15 bancos; (ii) pedidos de elementos às empresas envolvidas e ao Regulador Setorial; e (iii) diligências de inquirição.

 

Porque demorou a AdC sete anos a concluir este processo?

Não se deve confundir a duração do processo contraordenacional com a atividade de investigação e instrução a cargo da AdC, a qual não demorou sete anos. O processo foi aberto a 20 de dezembro de 2012 e realizou diligências de busca e apreensão a 6 de março de 2013. Só seis meses depois, em setembro de 2013, a AdC teve acesso aos elementos probatórios recolhidos, que estiveram em validação pelo tribunal, uma vez que se tratava de informação bancária. A nota de ilicitude foi notificada à empresas em maio de 2015. Para o decurso de tempo decorrido desde então, contribuíram significativamente as sucessivas decisões do Tribunal da Concorrência, Regulação e Supervisão, de atribuir efeito suspensivo aos recursos interlocutórios, decisões que foram inéditas neste contexto. Por esta razão, o processo acabou por estar suspenso mais de 360 dias.

Estamos perante um caso de elevada complexidade e dimensão, decorrentes da matéria objeto de análise, da existência de 15 bancos inicialmente visados no processo e da natureza da atividade económica em causa, mas igualmente da elevada quantidade de elementos constantes dos autos (mais de 90.000 ficheiros), designadamente em suporte informático e ainda do elevado número de informações classificadas como confidenciais pelos bancos.

O elevado grau de litigância foi, igualmente, um fator determinante para o período durante o qual decorreu a investigação, tendo os bancos investigados interposto 26 recursos interlocutórios, que geraram um total de 43 recursos judiciais (ver infra resposta à questão 10).

 

É verdade que na maioria dos recursos interpostos pelas visadas, os tribunais lhes deram razão?

Não. As visadas interpuseram 26 recursos interlocutórios, que geraram um total de 43 recursos judiciais (incluindo para o Tribunal da Relação de Lisboa e para o Tribunal Constitucional).

Somente 5 decisões (relativas a questões processuais) foram desfavoráveis à AdC.

 

Que dados foram determinantes para concluir que os bancos se concertaram de forma ilícita?

O conjunto concordante e inequívoco de centenas de documentos juntos aos autos, incluindo várias centenas de emails trocados entre as várias visadas, de onde se extrai, de forma inequívoca, a existência da concertação; elementos que foram, na generalidade, corroborados pelos testemunhos das pessoas inquiridas (colaboradores dos bancos em causa).

 

A prática já terminou?

De acordo com os elementos constantes dos autos, a prática terá durado, pelo menos, entre maio de 2002 e março de 2013, data em que a AdC realizou diligências de busca e apreensão nas instalações dos bancos visados.

 

Quais são os passos seguintes?

Por parte da AdC, o processo está concluído. Os bancos visados poderão recorrer da decisão da AdC para o Tribunal de Concorrência, Regulação e Supervisão, que apreciará esses recursos.

 

Há casos semelhantes fora de Portugal?

A AdC não tem conhecimento da existência de condenações semelhantes (nos mesmos mercados) noutros Estados Membros da União Europeia, sendo, por isso, esta uma condenação inédita.

 

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