Nos últimos cinco anos, os preços das casas no nosso país têm vindo a aumentar, tendo esse incremento sido superior a 50% em cerca de um quarto dos concelhos de Portugal, com as áreas metropolitanas de Lisboa e Porto a registarem os aumentos mais gritantes. Estes dados do INE não sendo novos não deixam de ser preocupantes, particularmente nestes dias em que vamos descobrindo os contornos da proposta de Orçamento do Estado para 2024 e as previsões económicas do Governo para o próximo ano.

Certo é que esta tendência coloca Portugal em quarto lugar no ranking dos países da União Europeia em que os preços mais subiram e, logo mais uma vez, no topo da lista, mas não necessariamente pelas melhores razões. É que ao mesmo tempo que os dados indiciam para uma cada vez maior dificuldade de acesso a uma casa para viver, seja por via do arrendamento, seja por via da aquisição, apontam também por uma aparente redução do stock de casas disponíveis no mercado. O que nos coloca perante um problema de muito difícil resolução.

Se é verdade que a proposta de Orçamento do Estado para 2024 avança com medidas e verbas que passam, nomeadamente, pelo apoio extraordinário à renda, por um programa de arrendamento para subarrendar, pela criação de um parque público de habitação a custos acessíveis, pela reabilitação de habitações devolutas do Estado, pela bonificação dos juros no crédito à habitação ou por um desconto na Euribor, muito fica a desejar quer quanto ao alcance efetivo destas medidas, sobretudo, se tivermos em conta que a crise da habitação em Portugal é apenas a ponta do icebergue de um problema mais amplo, complexo e estrutural.

Desde logo, a atual conjuntura internacional, marcada pelos impactos da guerra na Ucrânia nos preços dos produtos alimentares ou energéticos, tem colocado economias como a portuguesa sob uma pressão maior em matéria de competitividade. A economia nacional continua a estar marcada por uma elevada dependência do setor do turismo, e não tem fomentado tanto quanto deveria a inovação e o empreendedorismo, ao mesmo tempo que ao manter uma prática de salários historicamente baixos tem gerado uma debandada daquela que é a geração mais qualificada no Portugal democrático.

De modo que, contrariamente a sossegar-nos, e após uma primeira apreciação à proposta de Orçamento do Estado, a primeira reação é de “preocupação”. Palavra usada pelo próprio ministro das Finanças mesmo quando tentava convencer-nos da bondade do documento que vai reger as nossas vidas no próximo ano. Preocupação, porque não só o problema da habitação é um sintoma de um mal-estar mais generalizado, como o Orçamento do Estado tal como é proposto falha ao não se constituir como a resposta de que o país precisaria.

É anunciada uma nova atualização do salário mínimo nacional, mas o valor praticado e proposto para 2024 não se diferencia assim tanto do praticado em países da UE como Malta, Lituânia ou Grécia e continua muito longe do praticado em países como o da vizinha Espanha ou até da Eslovénia. E, por isso, um em cada dez portugueses que trabalham não conseguem escapar da situação de pobreza.

O Governo acena ainda com a subida dos salários na Administração Pública e com medidas que passam por uma atualização do Indexante de Apoios Sociais, pelo reforço do rendimento social de inserção ou por uma propalada “redução transversal” do IRS. Mas depois ao agravar a carga fiscal por via de impostos indiretos, o que está, na verdade, a suceder é dar com uma mão e tirar com a outra e, assim, continuamos neste enclave do Portugal dos pequeninos.