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“Portugal não tem mão de obra, ponto final”, afirma CEO da Casais

António Carlos Rodrigues aponta para o facto de em Portugal as escolas de formação profissional na área da construção estarem neste momento “com 10% da sua capacidade instalada porque não têm alunos”.
  • Cristina Bernardo
25 Setembro 2019, 20h46

António Carlos Rodrigues afirma que em Portugal a mão de obra não existe. “Nós não temos mão de obra, ponto final”. O CEO da construtora Casais falou ao Jornal Económico à margem da Civil Engineering Summit (CES) que decorre no Laboratório Nacional de Engenharia Civil (LNEC) em Lisboa, entre os dias 24 e 28 de setembro.

Quais são os principais desafios e dificuldades que a reabilitação urbana enfrenta atualmente?

Quando olhamos para a quantidade de edifícios a reabilitar nós vemos que temos ainda muitas décadas ainda de trabalho, mesmo a manter o ritmo atual para conseguir reabilitar as cidades. Se olharmos para Lisboa e Porto a situação está a expandir-se de uma forma central para as periferias, e tem tudo a ver com um driver económico que está dependente da economia mundial, mas também da nossa capacidade de continuar a atrair pessoas para cá.

Nós temos um problema demográfico e acho que vamos atingir o pico se não soubermos resolver o problema da demografia. Esse para mim é o maior desafio. Para mantermos isto sustentável temos de continuar a ter um modelo, e acho que Portugal tem uma capacidade diferente dos outros países da Europa, porque temos uma ligação sócio-económica com países que falam a nossa língua e que têm um bónus demográfico maior do que o nosso.

Apesar desse atraso para Europa, Portugal tem capacidade para arrepiar caminho na reabilitação urbana?

Sim. Massa crítica não nos falta em termos de edifícios a reabilitar. Temos o tema da demografia. Temos de ter consciência que somos um país mais próximo em termos demográficos de Inglaterra do que França. Estamos periféricos à Europa, as pessoas não vêm para cá a não ser de avião.

A nossa porta de entrada e saída é o aeroporto, que já devia estar com outra capacidade. Nós precisamos de ter a capacidade, de que se o mercado quer economicamente, nós precisamos de ter outro rapidamente para substituir. E nós não temos essa capacidade nos nossos aeroportos. Se existe um problema em Lisboa, as pessoas vão para Faro ou Porto. A nossa porta de entrada tem de ser maior.

Existe falta de mão de obra ou de mão de obra qualificada?

As duas coisas. A questão é que nós não temos mesmo mão de obra, ponto final. Se olharmos para as escolas de formação profissional na área da construção, elas estão neste momento com 10% da capacidade instalada porque não tem alunos. Mais uma vez estamos a olhar para outras geografias, porque existem pessoas que ainda têm interesse em trabalhar no nosso setor, a vontade imigrar e poderem melhorar de vida, tal como nós fizemos quando emigramos.

O principal tema é a falta de mão de obra. O segundo é a qualificação, que tem um outro problema e dimensão. Nós não temos um sistema que permita diferenciar a qualificação dos técnicos. O setor público é um exemplo muito prático pela forma em como não incentiva esse processo. A contratação de um serviço de engenharia ou fiscalização: não existe nenhum processo que faça a distinção entre o currículo e a capacidade de um técnico. Logo estou a dar um sinal ao mercado de que não estou a privilegiar a qualificação. E assim, vou privilegiar uma concorrência que acaba por ser desleal, porque canibalizo todo o sistema.

O sistema burocrático causa mais dificuldades do que a reabilitação do edifício em si?

Sim. Não sei se com o programa Simplex nós simplificámos coisas que não devíamos ter simplificado. Devíamos era ter aproveitado a tecnologia e manter a complexidade onde ela tem de existir. Manter a caracterização não é eliminar graus de qualificação. Depois a questão da legislação e aprovações das autarquias, isso é um grande detrator do investimento. Ás vezes temos investidores internacionais que estão habituados a outra dinâmica e tipo de práticas, com total transparência e por isso fazem a sua missão do projeto e têm uma expetativa de reabilitação muito mais rápida.

Se olharmos para a dimensão do nosso país vemos que a cidade de Lisboa tem as suas regras, o Porto tem as suas regras, Braga tem as suas regras. Não existe uma uniformização, ou seja, se um investidor investir tempo e dinheiro em conhecer as regras de Lisboa, a seguir fica por Lisboa, porque o esforço de aprender novas regras noutro local retrai-me de fazer investimentos.

O que pode então Portugal aprender com exemplos de fora?

Somos um país de brandos costumes. Não acredito que vamos ter problemas que outras cidades europeias tiveram até do ponto de vista social, das etnias e que não souberam tratar a questão demográfica, cultural e de reabilitação. Nesse aspeto nós não deixamos chegar a esses extremos. Podemos e devemos aprender com exemplos da Alemanha, que do ponto de vista da integração social já desde a segunda guerra mundial é um bom exemplo. Na altura do 25 de abril, quando tivemos o regresso dos retornados soubemos integrar cerca de um milhão de pessoas em Portugal. Para mim tem tudo a ver com ciclos. Agora tudo se tornou demasiado colado ao ciclo político. Não temos técnicos e engenheiros que deviam ocupar esses lugares, pois eles é que são os responsáveis por fazer estudos a médio longo prazo. Não é o ciclo político que cada vez que vem encomenda os seus estudos e faz os investimentos de acordo com os mesmos.

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