Portugal tem de combater o excesso de regulação e de burocracia para se tornar mais competitivo e atrair investimento estrangeiro, mas é obrigatório que faça uma reforma fiscal, defendem os economistas Nuno Torres e Óscar Afonso, no primeiro documento de discussão de 2025 do Gabinete de Estudos Económicos, Empresariais e de Políticas Públicas (G3E2P) da Faculdade de Economia do Porto (FEP).
Este documento, publicado este mês, é um position paper, caracterizado por conter reflexões fundamentadas sobre um dado tema económico e social que se enquadra nos objetivos do G3E2P de “produzir conhecimento económico, empresarial e social estratégico e útil para a sociedade, incluindo propostas de políticas públicas inovadoras”. É assumido como um trabalho em progresso, que poderá ser mais tarde aprofundada para desenvolver trabalhos de mais largo espectro.
Neste position paper sobre “o excesso de regulação e défice de concorrência nos mercados de produto em Portugal”, Nuno Torres e Óscar Afonso fazem 40 recomendações – que desmultiplicadas são muitas mais -, 20 das quais entendidas como prioritárias.
São dois autores reconhecidos. Nuno Torres é coordenador do G3E2P e antes foi investigador, economista da Associação Empresarial de Portugal e na CIP – Confederação Empresarial de Portugal. Óscar Afonso é diretor da FEP, mas contribuiu também para a elaboração do programa eleitoral da Aliança Democrática (AD), concorreu como independente nas listas da AD nas legislativas, em quarto lugar pelo círculo do Porto, tendo sido eleito e renunciado ao lugar para se manter na liderança da Faculdade de Economia. Foi ainda falado como possibilidade forte para assumir o Ministério das Finanças.
O ponto de partida para a reflexão é que Portugal tem excesso de regulação nos mercados de bens e serviços, quando comparado com outros com outros países da União Europeia (UE) e da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Económico (OCDE).
Isso é visível no índice de regulação nos mercados de produto da OCDE (PMR na sigla inglesa), em que a qualificação de Portugal melhorou, mas na exata medida da média, mantendo-se abaixo desta. O índice PMR de Portugal baixou 0,15 pontos, para 1,57 pontos (o que é positivo, por quanto mais baixa a pontuação, melhor a situação), enquanto a média da OCDE também caiu 15 centésimas, para 1,34 pontos. “Continuamos a registar o nono maior (e pior) valor dos 38 países da organização. A situação é ainda mais gravosa no contexto da UE, pois em 2023 o nosso índice foi o quinto pior em 26 países com dados (só a Roménia não foi avaliada) e piorámos uma posição face a 2018”, referem Torres e Afonso.
Na UE, apenas Malta, Luxemburgo, Chipre e Hungria têm um índice PMR maior que o de Portugal.
Os maiores défices de competitividade de Portugal no índice PMR, em 2023, respeitam “ao nível das distorções da intervenção do Estado, na avaliação de impacto das regulações (avaliação do seu efeito na concorrência, bem como o envolvimento de todas as partes interessadas e a regulação do lobbying), nas distorções induzidas pela propriedade pública (quanto ao âmbito da propriedade pública e, sobretudo, quanto à governação das empresas públicas) e no envolvimento em operações comerciais (contratação pública e operações nos setores dos serviços)”, assim como “ao nível das barreiras à entrada doméstica e estrangeira, no que se refere às barreiras à entrada do setor dos serviços, bem como na carga administrativa e regulamentar”.
Em sentido contrário, as maiores melhorias de ranking ocorreram nas barreiras à entrada nos setores de redes e nas barreiras ao comércio internacional, tendo os avanços sido marginais nas licenças e autorizações e na avaliação do impacto das regulações na concorrência, “que merece maior destaque, pois continuamos a ter dos piores registos da UE e OCDE, isto apesar de ter sido o indicador onde mais melhorámos em termos absolutos entre 2018 e 2023”, referem os autores.
“A análise dinâmica evidencia que perdemos competitividade nos rankings desde 2018 não apenas no indicador de âmbito da propriedade pública, onde tivemos um retrocesso em valor absoluto, mas também na grande maioria dos indicadores cujo valor não mexeu – caso da regulação do lobbying, onde perdemos várias posições, tal como nos requisitos administrativos para empresas, contratação pública e governação de empresas públicas –, o que alerta para a importância de processos de melhoria permanente e estruturais nas áreas da regulação”, acrescentam.
Por isso, as primeiras seis das 20 recomendações prioritárias feitas dizem respeito à avaliação e reporte dos impactos da regulação, incluindo, no quadro da revisão da regulação existente, implementar “uma revisão sistemática”, eliminando normas redundantes ou obsoletas, e criar um observatório da regulação.
Segue-se a governação pública, em que se identifica “um mau posicionamento no que se refere às distorções provocadas pelo âmbito da propriedade pública (como a presença estatal em setores onde não há razões claras de interesse público) e pela governação das empresas públicas no que se refere ao isolamento da disciplina de mercado e às obrigações de serviço público”. Aqui, recomenda-se a reavaliação do portefólio de empresas públicas para identificar quais as empresas ou setores que ainda justificam a propriedade pública “com base em critérios de interesse público, segurança nacional ou falhas de mercado. Depois, mais quatro, incluindo a clarificação das obrigações de serviço público.
Nas barreiras à entrada nos setores de redes em geral, os autores consideram que Portugal compara bem, ainda que falte detalhe, “pois temos um exemplo positivo nas telecomunicações e um negativo na ferrovia”. Daí que neste segundo caso defendam a eliminação das barreiras à entrada e o aprofundamento do processo de liberalização da ferrovia em Portugal, “sobretudo no transporte de passageiros, seguindo o modelo de sucesso de Espanha”, e a revisão do Plano Ferroviário Nacional para alargar o uso da bitola europeia.
O Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) também é referido, ainda que se considere que o impacto global esperado no índice PMR da OCDE para Portugal se afigure “moderado” e que “dificilmente resultará numa melhoria substancial e abrangente”.
“Para avanços mais significativos no índice, Portugal precisaria de reformas mais estruturais”, consideram Nuno Torres e Óscar Afonso, por isso, para na conclusão do documento defendem uma “reforma profunda do Estado, incluindo do sistema fiscal, que tem sido sucessivamente adiada”.
“Por mais que Portugal melhore no índice PMR, nunca será competitivo se não baixar de forma expressiva a sua carga fiscal”, afirmam.
Entre parêntesis são apontadas as 20 definidas como prioritárias.
Quanto ao âmbito da propriedade pública
Quanto à governação das empresas públicas e disciplina de mercado
Quanto às obrigações de serviços público
Em geral
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