O número de candidatos ao ensino superior subiu este ano muito significativamente. 62.657 é o número total de candidaturas ao Ensino Superior Público, só na 1ª fase do concurso nacional. O aumento da procura estende-se, aliás, às instituições de ensino superior não públicas. É preciso recuar a 1996 para encontrar números com esta dimensão.

É uma boa notícia, tanto mais que a taxa de natalidade está a cair quase continuamente desde 2000. Ter mais alunos a terminar o ensino secundário e mais alunos a concorrer e a frequentar o ensino superior – apesar de existirem menos jovens em idade escolar – é uma prioridade estratégica.

O desafio, porém, não pode ser apenas quantitativo e o caminho não pode ser o facilitismo.

Uma das razões que explica o aumento do número de candidaturas já registado este ano – além de uma diferente distribuição dos candidatos entre a 1ª e a 2ª fase – é a inflação das notas de acesso. Para os alunos, notas altas são, evidentemente, um fator de confiança numa candidatura bem-sucedida.

No pico da pandemia, o Governo decidiu que este ano não se realizariam os exames nacionais das disciplinas do secundário – que constituem, como é sabido, um instrumento fundamental de correção das disparidades decorrentes dos diferentes critérios de classificação adotados pelas escolas. Os alunos fizeram, portanto, apenas os exames específicos de ingresso no ensino superior, relevantes para os cursos a que se candidataram.

Porém, nem mesmo estes exames seguiram o modelo dos anos anteriores. Por indicação do Instituto de Avaliação Educativa (um tal de IAVE, cuja página oficial permanece em remodelação) –, os enunciados foram constituídos essencialmente por perguntas optativas. Não obstante, foi dada aos alunos a possibilidade de responder a todas as questões, ficando os examinadores com a obrigação de escolher as melhores respostas.

O resultado de tão original modelo de avaliação foi um aumento extraordinário das notas. Números redondos, em Biologia, a média subiu de 10 para 14 e a moda de 9 para 16; em Físico-Química, a média aumentou de 10 para 13 e a moda de 6 para 18; a História, a média disparou de 10 para 14 e a moda de 10 para 18; e finalmente, em Matemática, a média saltou de 11 para 13 e a moda de 9 para 19.

É claro que os números carecem de uma análise mais alargada, que aqui não pode ser feita. Desde logo, o aumento das médias pode em parte ser explicado pela diferença entre o universo de alunos que – o ano passado e este ano – fizeram cada um dos exames. Mas alguns números absolutos são incontornáveis: em 2019, apenas 1100 alunos tiveram 19 a Matemática; este ano esses 1100 transformaram-se em 4628 alunos. Anos a fio de angústia por causa dos maus resultados da disciplina de Matemática e, da noite para o dia, Portugal transformou-se num país de matemáticos…

É evidente que estas políticas têm um preço elevado.

Começa pela óbvia discriminação, no acesso aos diferentes cursos do ensino superior, de todos os candidatos que não beneficiaram desta verdadeira inflação administrativa das notas, como os alunos que realizaram exames em anos anteriores (e que ainda podem ser candidatos este ano) e os alunos das escolas estrangeiras e internacionais (que não beneficiaram de regimes especiais na formação das suas notas de candidatura). Mas será também a frustração das expetativas dos muitos alunos que, com elevadas notas de ingresso, vão ficar de fora dos cursos que escolheram. E a dificuldade que as Universidades vão ter para colmatar as lacunas de conhecimento de muitos dos alunos que vão receber.