Depois de quatro anos na liderança de um governo de coligação PSD/CDS, numa das mais dramáticas situações económicas da história nacional, e de pouco mais do que dois anos a liderar o Partido Social Democrata na oposição, Pedro Passos Coelho decidiu abdicar da presidência do partido e abandonar as lides parlamentares.

Sabemos, agora, que vai dedicar-se ao ensino, lecionando disciplinas na área da Administração Pública no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas e que irá, segundo se anuncia, integrar o corpo docente de outras duas instituições de ensino superior.

Desde que, nos últimos dias, veio a público esta nova atividade de PPC, muitos têm sido os comentários que têm colorido as redes sociais sobre o tema, com alguns a cruxificarem Passos Coelho pela opção tomada, sobrevalorizando a falta de currículo académico do mesmo, enquanto outros exaltam os méritos profissionais do novo docente universitário e o seu profundo conhecimento da realidade política e da administração pública.

Não conheço pessoalmente Pedro Passos Coelho, pelo que a opinião que tenho sobre o mesmo resulta da análise que faço, na qualidade de observador atento, da sua governação e da sua liderança do Partido Social Democrata na oposição.

Sempre defendi que a academia tem tudo a ganhar com uma colaboração fecunda entre os académicos, que dedicam a sua vida ao estudo e à investigação, e os profissionais experimentados, que podem trazer para a sala de aula uma mais-valia resultante dos problemas práticos que tiveram que enfrentar e procurar solucionar. As visões complementares de ambos podem ser profundamente enriquecedoras para os alunos.

PPC teve, nos quatro anos em que liderou Portugal, uma oportunidade única de conhecer dossiês da maior relevância nacional e internacional, foi deputado durante mais do que uma década, presidiu a um dos maiores partidos portugueses durante oito anos, conhece, como poucos, os meandros da política, lidou com algumas das mais importantes personalidades mundiais.

Se currículo académico é coisa que não possui, currículo profissional, especialmente na área da Política e da Administração Pública, é coisa que lhe não falta. Ora, tendo decidido fazer um interregno na sua atividade política, Passos Coelho é um cidadão que, como qualquer outro, tem que utilizar as suas ferramentas profissionais para obter um emprego que lhe permita viver.

Podia, certamente, como outros fizeram, “encostar-se” ao cargo de deputado, ao mesmo tempo que acumulava outras funções no setor privado, em áreas que não são legalmente incompatíveis com o mandato que lhe foi conferido pelos portugueses.

Em alternativa, podia, como muitos no passado fizeram e no futuro farão, assumir cargos em empresas privadas com as quais, de uma forma ou de outra, foi estabelecendo um relacionamento durante o período em que foi primeiro-ministro. Ou, finalmente, podia piscar o olho a um qualquer cargo numa instituição pública ou num organismo internacional. Decidiu abandonar o Parlamento, não bater à porta de empresas privadas, não se insinuar junto de organismos públicos ou de organizações internacionais. Perante as diferentes possibilidades que certamente se lhe abriram, decidiu embarcar na aventura de ser docente universitário, numa área que conhece, na qual está à vontade, em que tem currículo profissional.

Não ficará, seguramente, como não ficou no passado, rico, tanto mais que o vencimento de um docente universitário está muito longe de ser principesco. Continuará, por certo, a viver em Massamá, a pagar as suas despesas, a viver, como a esmagadora maioria dos portugueses, do seu trabalho.

Não conheço pessoalmente PPC, mas tenho-o como um homem sério, teimoso, com defeitos, com qualidades, que, numa época em que a política é vista como uma atividade normalmente pouco recomendável aos olhos dos cidadãos, contribuiu e continua a contribuir para dignificar a causa pública.