Aquando das medidas que foram “desfilando” na primeira vaga da pandemia na primavera de 2020, estive na linha da frente a aplaudir. Porque achei que tudo estava a ser feito num sentido que me pareceu bastante positivo: a suavização dos pagamentos devidos à Autoridade Tributária e à Segurança Social, as linhas de crédito de apoio à atividade empresarial com garantias públicas, os regimes de moratórias no pagamento de prestações de financiamentos às empresas, os regimes de lay-off criados para proteger o emprego, para enumerar apenas alguns, entre muitos outros.
A mensagem era clara: retirar da atividade empresarial este nefasto efeito exógeno, protegendo acima de tudo os postos de trabalho e as empresas com comprovada viabilidade económico-financeira que, afinal, só precisavam de uma ajuda para que a escassez de atividade e a consequente perda de liquidez não comprometesse a perda de capacidade instalada no médio a longo prazo.
Tive aqui oportunidade de escrever que era necessário repensar o ritmo de evolução do endividamento das empresas. Desde 2014, o tecido empresarial português veio seguindo um caminho de recapitalização. A crise financeira trouxera consigo empresas descapitalizadas, anémicas. Grande parte sucumbiu aos elevados níveis de endividamento e a baixos níveis de rendibilidade que reduziram até à asfixia os reduzidos níveis de autonomia financeira, com forte dependência de capitais alheios. Houve empresas que desapareceram na crise. E outras entraram no caminho de fusões e aquisições para ganharem dimensão que permitisse salvar a sua massa crítica produtiva.
Chegados aqui, as empresas que estão abertas e a trabalhar neste contexto difícil, ou foram as que sobreviveram à “depuração” da crise passada com mérito e distinção, ou as que nasceram a partir daí num contexto macroeconómico substancialmente diferente, assente em modelos de negócio diferentes e mais adaptados aos nossos tempos. Parto, portanto, do pressuposto que o seu padrão de viabilidade económica é diferente, para melhor.
Surgimos às portas da pandemia com um tecido empresarial mais capaz, mais preparado, e com rácios de autonomia financeira maiores, com modelos de negócio viáveis, na esperança de vingar no futuro próximo, assim possibilitasse o contexto.
As Pequenas e Médias Empresas (PME) portuguesas são as que mais empregam portugueses. Portanto, sugere a lógica que se possa daqui deduzir que dar condições a estes empresários é proteger o emprego e a capacidade de gerar valor para a economia portuguesa, cuja capacidade de gerar riqueza já está tão anémica que proporciona a sucessiva perda de lugares no ranking comunitário do Produto Interno Bruto (PIB) per capita. Neste contexto, não assegurar mecanismos de apoio a empresas produtoras de bens transacionáveis, de serviços da fileira do turismo, de indústria de ponta na ciência e tecnologia, na agricultura e pecuária, será contribuir para uma asfixia do pouco que resta da capacidade de gerar valor e emprego em Portugal.
Os empresários portugueses precisam desesperadamente de mecanismos de capitalização das suas empresas. Não precisam de mais endividamento. E tenho dúvidas que precisem de obras públicas que ressuscitem mitos do passado recente. A bazuca comunitária precisa de ir direitinho para estas forças produtivas, geradoras de emprego, sob a forma de capital. Estude-se o que estas empresas eram antes da Covid e depois da Covid, e utilizem-se critérios de aferição da viabilidade económica, que ajudem a repor a base de capital perdida com a pandemia. Porque viabilizar estas empresas é viabilizar o país, a mais nobre função do Estado.