A trágica vaga de incêndios deste verão veio relançar o debate sobre a importância económica da floresta, enquanto setor que produz essencialmente bens transacionáveis e é um dos maiores exportadores líquidos nacionais. Calcula-se que a fileira florestal represente 1,2% do PIB e 6,5% das exportações do país, sendo as suas atividades responsáveis por cerca de 66 mil postos de trabalho. No contexto da UE, estes indicadores só são ultrapassados pela Finlândia e pela Suécia.

Trata-se, mais do que disso, de um recurso indispensável ao equilíbrio ambiental do território. Por conseguinte, a prevenção dos incêndios passa também muito pelo desenvolvimento da fileira florestal. Ter mais atividades económicas baseadas na floresta significa uma melhor gestão dos recursos florestais (limpeza, ordenamento, planeamento e exploração), uma maior capacidade de repovoamento e níveis mais elevados de sustentabilidade ambiental. Uma floresta com utilidade económica e valor ecológico é, por isso, menos vulnerável aos incêndios, que têm origem sobretudo em terrenos baldios e sem manutenção.

O desenvolvimento da fileira florestal deveria implicar à cabeça um ordenamento do território que há anos que anda a ser adiado. Talvez por ser trabalhoso e não dar visibilidade imediata. Tal  reforçaria a produtividade e competitividade das atividades tradicionais – silvicultura, exploração madeireira, indústria da cortiça, produção de celulose e do papel, etc. –, mas acima de tudo criaria espaço para um foco especial na dinamização da inovação e do empreendedorismo que faça emergir novas atividades no setor.

Esta dinâmica empreendedora deverá envolver quer pequenos negócios – desde os simples, mas muito importantes, serviços de limpeza das florestas à microprodução agroalimentar (cogumelos, mel, frutos, plantas aromáticas e medicinais, etc.) –, quer empresas de base tecnológica que operem em áreas de grande potencial, como as energias renováveis (biomassa), a indústria química, o turismo, o mobiliário, as tecnologias digitais (georreferenciação e cartografia digital, por exemplo), entre outras. Ao dinamizar a inovação e o empreendedorismo na fileira florestal está-se, desde logo, a carrear conhecimento científico, competências tecnológicas e criatividade para zonas menos desenvolvidas do país.

Todo este know-how irá potencialmente materializar-se em novos produtos, novas soluções tecnológicas, novos processos produtivos e novos modelos de negócio que, para além de proveitos económicos, vão ter efeitos sociais e ambientais positivos. Sociais, porque se cria riqueza e emprego em regiões menos favorecidas, ajudando a fixar populações e a atrair novos habitantes (empreendedores, investigadores, informáticos, gestores, etc.). Ambientais, porque se promove a sustentabilidade da floresta e se reduz o risco de incêndios com projetos de empreendedorismo que dependem deste recurso natural.

Por outro lado, o desenvolvimento de centrais de biomassa pode ser o polo agregador de grande parte deste valor. Pois, por um lado, geram investimento industrial e postos de trabalho em zonas interiores e, por outro, obrigam à limpeza das matas numa área muito significativa, uma vez que é este o “combustível” das centrais.

Já existiu no passado vontade governamental para licenciar centrais de biomassa, mas infelizmente o foco no setor acabou por desaparecer e muitas centrais não saíram do papel. O desenvolvimento tecnológico dos últimos anos em muito ajudou a que o custo da tecnologia descesse substancialmente, tornando-a hoje mais competitiva. O que, e adicionados todos os efeitos externos positivos, pode efetivamente ser uma excelente aposta.

Perante isto, o processo de reconstrução das zonas devastadas pelos incêndios neste verão e nos anteriores deve incluir incentivos à inovação e ao empreendedorismo na fileira florestal. Trata-se não só de reanimar a economia local e de melhorar a qualidade de vida das populações afetadas, mas também de criar um ambiente empresarial que, no futuro, garanta a sustentabilidade económica, social e ambiental do interior do país. Poder-se-ia pensar, por exemplo, na criação de um fundo público específico para a promoção do empreendedorismo na floresta, em cuja gestão participassem autarquias, associações empresariais e organizações socioprofissionais das regiões fustigadas pelos fogos.