O Plano Estratégico de Combate à Fraude e Evasão Fiscal e Aduaneira (2018-2020) prevê a intensificação da utilização de Acordos Prévios de Preços de Transferência (APPT) para assegurar a previsibilidade no tratamento fiscal dado a determinadas operações no seio dos grupos económicos. É um propósito acertado.

Para estes grupos, por exemplo, o regime especial de tributação dos grupos de sociedades (RETGS) revela-se útil pois torna desnecessária a utilização de mecanismos artificiais de faturação intra-grupo para evitar que se pague IRC a mais numas empresas, quando outras do mesmo grupo apresentam prejuízos. Trata-se um grupo de empresas como se de uma só se tratasse. E só não o é na sua plenitude porque, ao contrário do que acontecia no antigo regime, agora não se eliminam as operações intra-grupo. No caso de grupos societários que não optaram pelo RETGS, tudo se complica no plano da otimização fiscal dos resultados globais versus individuais.

Mesmo no âmbito do RTGS, a temática da tributação dos grupos suscita problemas complexos. Existem mecanismos gerais de controlo no plano das obrigações declarativas, como a documentação de preços de transferência para as empresas que integram tais grupos, se alcançarem os valores de proveitos previstos na legislação aplicável. Previne-se, assim, a desnatação dos resultados no que respeita a transações efetuadas com entidades relacionadas excluídas do RETGS, sejam as não residentes em Portugal ou aquelas em que o nível de participação não atinge o patamar previsto na lei para poderem integrar o perímetro. Controla-se a manipulação de preços em transações que não são neutras por, de um lado, gerarem rendimentos refletidos na demonstração de resultados e, do outro, uma relevação temporária ou definitiva em balanço (alienação de equipamentos amortizáveis, de intangíveis, de determinadas participações sociais, trespasses, etc…). Salvaguarda-se a criação artificial de desvios no apuramento do lucro tributável individual que, embora no RETGS não seja relevante para efeitos de IRC, tem impacto direto nas Derramas Municipal e Estadual que consideram o lucro individual, bem como a dedução de alguns benefícios fiscais que estão associados à coleta individual da empresa que gera o benefício. Permite ainda, em caso de cessação de aplicação do RETGS, suportar a prática de preços de mercado nas transações que foram realizadas entre as diferentes empresas que integravam o perímetro. O mecanismo de prova individual da conformidade com o princípio arm’s length através da documentação de preços de transferência nos grupos empresariais em geral, e no RETGS em particular, minimiza a erosão artificial das bases tributáveis e restringe comportamentos que geram situações de vantagem competitiva artificial pela via fiscal.

Foram dados passos importantes na melhoria do RETGS, como a possibilidadeda inclusão de sociedades não residentes em Portugal no que respeita ao cômputo da percentagem direta ou indireta exigida, ou o regime da consolidação horizontal, quando a sociedade dominante do grupo não é residente em Portugal. Poder-se-ia ter ido mais longe através da adoção da consolidação para efeitos de IVA (Organschaft). Mas, acima de tudo, importa tratar do ponto de vista legislativo os grupos societários e o RETGS com o máximo cuidado, não dando motivos às equipas da inspeção tributária para atuarem perante os mesmos, como se tem verificado em casos pontuais, com excesso de zelo e evitando-se, assim, o acumular de contencioso tributário. A substituição da documentação obrigatória de preços de transferência nos grupos empresariais por APPT abrangentes é um caminho seguro neste sentido. Não se baixando a guarda no que respeita ao risco de diluição da base tributável com perdas significativas para o Estado, oferece-se um nível de segurança jurídica adicional aos grupos que queiram negociar aqueles Acordos em alternativa à preparação de documentação de preços de transferência. Para tal será necessária uma revisão do regime dos APPT para que os mesmos possam ser negociados numa lógica de grupo.