É uma ideia conhecida. Os programas eleitorais só são um problema se não existirem. Existindo, merecem as notícias e os comentários da sua apresentação, e para alguns partidos mais umas notas, por evidente discriminação mediática. Mas exigia-se que pelo menos não distorcessem o que está escrito em letra de forma.

Por exemplo, descobrir, como faz um Editorial do “Público” de dia 3 de Setembro, de Manuel Carvalho, que o Programa do PCP (e do BE), estando “contra o modelo capitalista”, “sugerem” que o dito modelo “inventa crises e as usa para punir os trabalhadores”. É uma falsificação só compreensível por preconceito ideológico e partidário e pura manipulação. (Uma interrogação: como é possível que o Director de um jornal dito de referência, escreva/invente tal coisa?)

Há um défice que permanece nas análises dos Programas. É a falta de verificação da compatibilidade, da coerência, da consistência entre os objectivos propostos e as políticas que anunciam (ou sobre as quais fazem silêncio) para lhes dar resposta, para os concretizar.

São vários os partidos que enunciam os problemas do défice demográfico, dos baixos salários, das desigualdades sociais e regionais, do investimento, da debilidade da estrutura produtiva, das carências dos serviços públicos. Mas depois nada dizem sobre como reverter os baixos rendimentos dos que trabalham!

Como garantem, numa questão absolutamente estratégica para o país, “uma emergência nacional”, um aumento generalizado e significativo dos salários. Como e quando pretendem acabar com os trabalhadores pobres. Como travam a sangria emigratória de jovens trabalhadores qualificados, sem outro nível remuneratório.

Que propõem em matéria de legislação laboral? Nada. Em geral, as velhíssimas teses dos salários atrás dos acréscimos de produtividade, que nos conduziram a um país de baixos salários no contexto europeu, e baixas produtividades! Inventam uns paliativos para o problema demográfico, e pouco mais.

Como ultrapassam os desequilíbrios territoriais, sem regionalização e sem políticas orçamentais, agroflorestais e industriais e outras adequadas à criação de emprego no interior? Com pseudo descentralizações, associações de municípios e somatórios de medidas desgarradas dos diversos ministérios, não vamos lá. Como avançam de facto no investimento público e na dinamização do privado, sem quebrar os constrangimentos e imposições da UE?

Como defendem a produção nacional? Por exemplo, como revertem a liquidação em curso da produção leiteira, um dos poucos produtos agropecuários estratégicos em que somos autossuficientes? Ou como se posicionam face ao anunciado Tratado do Mercosul, que poderá assestar o golpe de morte no que resta da produção pecuária nacional? É com a redução dos efectivos pecuários, em nome da “neutralidade carbónica”? Como se responde com eficiência e prontidão em inúmeros serviços públicos, como a saúde ou a protecção civil, entre tantos outros, sem os recursos humanos e materiais necessários?

Ou ficamos sem saber como respondem aos objectivos a que se propõem, ou as propostas anunciadas negam-nos mesmo.

O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.