O atual modelo de financiamento do ensino superior tem nas receitas próprias das instituições um dos seus pilares. Por exemplo, o Instituto Superior Técnico, maior escola de engenharia do país com 11.533 alunos nos três ciclos de estudo e um corpo de 870 docentes e investigadores, dispõe de um orçamento anual na casa dos 100 milhões de euros. Metade são garantidos pela própria instituição e destes 10% são propinas. A realidade da maior parte das instituições de ensino superior não é muito diferente desta.
Criadas em 1997, as propinas são hoje parte fundamental do financiamento do ensino superior e o sistema não poderá abrir mão dele sem compensação. O tema voltou a ganhar prioridade política na semana passada, com o ministro da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior a admitir que o seu fim é concretizável a dez anos. Na Convenção Nacional do Ensino Superior, promovida pelo Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), que se realizou no ISCTE-IUL, Manuel Heitor contou com o apoio de dois secretários de Estado – Alexandra Leitão, da Educação, e Pedro Nuno Santos, dos Assuntos Parlamentares – e do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, que na sessão de encerramento defendeu idêntico desiderato. Muitas vozes se ouviram desde então, umas contra, outras a favor da eliminação das propinas do 1º ciclo do ensino superior, isto é, nas licenciaturas.
Um primeiro passo nesse sentido parece ter sido dado já este ano, com a descida em 20% do teto máximo das propinas que se encontravam congeladas desde 2016. Aquando da aprovação do Orçamento de Estado, que consagra a medida, o presidente do_Técnico, Arlindo Oliveira, disse ao Jornal Económico que a alternativa era investir em residências universitárias, nas grandes cidades onde os custos de habitação são mais elevados.
Como vê a ideia apresentada na Convenção Nacional do Ensino Superior pelo ministro Manuel Heitor de eliminar as propinas no 1.º ciclo?
A eliminação das propinas permite remover uma das barreiras à frequência do ensino superior, sendo por isso de saudar. Porém, poderá vir a agravar ainda mais o crónico subfinanciamento das universidades, se não for devidamente compensada por dotações do Orçamento do Estado. Por outro lado, não irão beneficiar da medida os alunos mais carenciados (que já têm uma bolsa que cobre as propinas) nem irá contribuir para resolver o maior obstáculo à frequência deste nível de ensino, que são os custos de vida nas grandes cidades onde estão as maiores e mais competitivas universidades.
Que medidas poderão, em seu entender, ser tomadas, visando facilitar o acesso ao superior?
A medida mais eficaz será construir residências e infraestruturas para estudo que permitam aos alunos deslocados suportar os custos de frequência do ensino superior. O reforço de bolsas de apoio social é uma outra medida que também pode ser reforçada e que endereçaria mais diretamente as dificuldades existentes.
Qual é a sua opinião sobre o atual modelo de financiamento das instituições de ensino superior?
As instituições de ensino superior portuguesas estão fortemente subfinanciadas. Na área da engenharia, ciência e tecnologia, o Técnico concorre diretamente com instituições que têm orçamentos muito maiores, algumas delas com financiamentos mais de 10 vezes superiores.
A eliminação das propinas permite desde já antever uma maior dificuldade em reforçar o financiamento das instituições universitárias, que assim continuarão a enfrentar dificuldades cada vez maiores em competir internacionalmente.
Qual o orçamento do Técnico para 2019? Que peso tem o financiamento próprio e, em concreto, quanto representam as propinas?
O IST tem um orçamento de cerca de 100 milhões de euros, dos quais aproximadamente 50% são Orçamento do Estado, 10% são propinas e o restante são receitas próprias obtidas em concursos nacionais e internacionais. Existem ainda mais cerca de 25 milhões de euros obtidos por instituições privadas sem fins lucrativos associadas ao IST, que são inteiramente obtidos em concursos competitivos, conduzindo a um financiamento total do universo IST de cerca de 125 milhões de euros, dos quais cerca de 10 milhões são propinas.
Que impacto financeiro teria a eliminação das propinas na sua instituição?
Se não for compensado pelo aumento do Orçamento do Estado, seria desastroso, e impediria o funcionamento normal da instituição. A reposição desta verba, por via do Orçamento do Estado, é essencial e urgente, dado que a margem existente para investimento e manutenção de infraestruturas é nula.
Na área do financiamento próprio, que subrubricas mais deverão crescer este ano?
É de esperar que o financiamento obtido por via competitiva de financiamento de projetos venha a subir, embora de forma não muito marcada.
Artigo publicado na edição nº1972, de 18 de janeiro, do Jornal Económico
Taguspark
Ed. Tecnologia IV
Av. Prof. Dr. Cavaco Silva, 71
2740-257 Porto Salvo
online@medianove.com