A Lei do Orçamento de Estado reduziu o valor máximo da propina a fixar pelas instituições de ensino superior dos 1.063,47 euros para 871,52 euros, provocando um impacto financeiro de sensivelmente 50 milhões de euros nos cofres públicos. Sem surpresa, o país lançou-se num acalorado debate ideológico sobre a gratuitidade do ensino superior, onde têm cabido comentários que vão do puro lirismo ao mais profundo realismo. Importa começar por deixar claro que, no plano dos princípios, sou favorável à gratuitidade do ensino em geral, incluindo do ensino superior.

Compreendo, todavia, que em países que enfrentam graves dificuldades financeiras, onde a carga fiscal atingiu níveis extremos e onde se travam debates complexos sobre o destino dos recursos públicos, o tema seja colocado em cima da mesa. Vale, no entanto, a pena refletir sobre um conjunto de aspetos que, nestes dias, têm atraído menos atenção.

Primeiro, não obstante as evidências, parece que alguns não se deram conta que em Portugal o ensino superior não é gratuito. Não obstante o financiamento público, o ensino superior é parcialmente financiado pela generalidade dos seus beneficiários diretos, os estudantes, por via das propinas. O atual debate é apenas sobre a redução do seu valor máximo.

Em segundo lugar, importa recordar que o objetivo que a medida anunciada pretende servir, o reforço do ingresso de jovens no ensino superior, constitui um pilar estruturante das políticas públicas de qualquer Estado desenvolvido. Alcançá-lo não beneficia apenas os jovens que obtêm educação superior, mas a sociedade como um todo em diversas vertentes, incluindo a económica, cultural e democrática. Questão diferente é a de saber se a medida em questão é a mais acertada para atingir o objetivo definido.

A este respeito, importa não esquecer que num país com o rendimento médio por habitante que Portugal apresenta, o pagamento de uma propina para a frequência do ensino superior é, seguramente, um encargo relevante para as famílias. No entanto, a propina dificilmente será o mais encargo mais pesado. O custo de vida do estudante, que inclui a  alimentação, os transportes e o alojamento, facilmente representa um encargo bastante superior ao da propina.

A questão é, pois, a de saber, se o Estado está disponível para reforçar em 50 milhões de euros o investimento no ensino superior, até que ponto reduzir o valor máximo das propinas é o que mais incentiva o reforço do ingresso de jovens no mesmo.

Tudo indica que não. Investir idêntico montante em mais e melhor alojamento universitário ou no aumento do apoio social de estudantes necessitados, tornando-o mais impactante e inclusivo, tenderiam, à primeira vista, a ser medidas mais eficazes. No entanto, e acima de tudo, não se viu que tivesse tido lugar qualquer reflexão robusta sobre as medidas mais adequadas a servir o propósito definido. Parece, isso sim, que foi escolhida a medida mais fácil de usar como bandeira eleitoral, prejudicando-se outras mais adequadas a reforçar, de facto, o acesso dos jovens ao ensino superior. É uma pena, mas, assim, vamos continuar na cauda da Europa…