É velho como o mundo, a realização clandestina, anónima de determinado facto, atribuindo-a, ou melhor criando as condições para que outros a atribuam, ao adversário, e assim “provocar” medidas de retaliação pelo próprio (o autor do facto) ou terceiros!

É bem conhecido o incêndio do Reichstag (1933) pelos nazis de Hitler, atribuindo a culpa aos comunistas para assim justificar a sua perseguição e a proibição do Partido Comunista da Alemanha. Há exemplos caseiros. As acções provocatórias do Verão Quente/PREC do ELP, MDLP, etc., com a participação da CIA e Carlucci, e apadrinhadas por gente muito responsável de partidos que hoje fala indignada contra o terrorismo. Por vezes com a “colaboração” de grupelhos esquerdistas, “engolindo” a provocação e fazendo o frete aos provocadores. Por exemplo, a revista ao arcebispo de Braga no aeroporto de Lisboa pelo COPCON.

Menos conhecida, e não só porque não concretizada, por retracção de quem a ia realizar, a projectada acção de terrorismo (bem ao jeito de algumas do presente) que o operacional bombista Ramiro Moreira confessou à PJ: a “encomenda” para “que armadilhasse um automóvel, carregado com 100 quilos de plástico, para rebentar no Santuário de Fátima”. (Ver o livro recente de Miguel Carvalho, “Quando Portugal Ardeu”). O objectivo era cristalino: atribuir ao PCP e a outras forças de esquerda a sua autoria material. Assim os desacreditavam junto do povo e justificavam a sua repressão e os actos terroristas e bombistas de assalto às suas sedes.

E poucos (ao que parece) recordarão Colin Powell, o secretário de Estado de Bush, exibindo ao Conselho de Segurança da ONU as provas das “armas destruição massiva”, incluindo as “lethal chemicals” pretensamente existentes no Iraque, para justificarem a posterior invasão e destruição de um país – uma das origens da multiplicação das redes terroristas. Mas talvez alguns se lembrem do recente Relatório do Parlamento Britânico sobre o tema, condenando Blair.

Ora, por estes dias, a representante dos EUA no Conselho de Segurança repetiu a cena, desta vez com fotografias das vítimas de gás tóxico em Khan Sheikhoun (Idlib), atribuindo à Síria a responsabilidade para justificar o ataque dos 59 mísseis Tomahawk! Que os comparsas de Trump, Hollande, Merkel, May e outros na agressão à Síria façam por acreditar nisso, nada de admirar. Mas é inacreditável que jornalistas e comentadores, dando provas de completa ausência de deontologia profissional e total “mergulho” na onda mediática que preparou a decisão dos EUA, dêem como provada a autoria moral e material da Síria. Nem uma dúvida! Nem outras hipóteses, apesar das muitas razões, para que fossem equacionadas. Nada. Assad e o seu “regime” são réus e culpados. A sentença foi lavrada nas páginas dos jornais, rádios e televisões. Assim o provam os mísseis de Trump. Diga-se, não é por ignorância ou ingenuidade!

O autor escreve segundo a antiga ortografia.