1. O Ocidente perdeu demasiado tempo na ilusão de conseguir converter Vladimir Putin às delícias da democracia liberal. Porém, a Rússia é grande demais para não ser governada como um império, logo, a autocracia, a ditadura é, por muito que seja condenada e bem pela comunidade internacional, o modus operandi de quem a lidera, e isso não irá mudar.
Putin é um homem do passado, criado e treinado nos tempos da Guerra Fria, com vívida memória do império soviético e, nos seus sonhos imperiais que hoje perturbam o mundo, mais do que Pedro, o Grande ou Ivan, o Terrível, a sua influência é o reino medieval de Kievan Rus que teve também ao seu leme um Vladimir, o Grande.
A Rússia aproveitou a fragilidade do mundo, um líder americano sem apoio popular e fragilizado e uma União Europeia que sem Angela Merkel não tem uma linha de orientação devidamente coordenada, apesar das múltiplas reacções em cadeia de apoio à Ucrânia. Putin sente o mundo ocidental cobarde e com medo de um conflito em larga escala, e por isso aproveita para meter o pé e reconstruir o espaço vital do seu país.
Se o mundo titubeia, Putin, formatado pelas melhores técnicas do KGB, ameaça e pressiona.
Na semana passada, li a biografia de Angela Merkel, “A chanceler” de Kati Morton. Era a líder que melhor lidava com ele. A sua formação científica levava-a a ter a paciência para aturar o comportamento por vezes desequilibrado e com retórica recheada de mentiras. Lá pela página 294 vemos com foto o carácter provocatório e intimidador do presidente russo.
A 21 de janeiro de 2007, Putin sabendo que Merkel tinha medo de cães, soltou a sua cadela Koni na reunião na sua residência de Sochi. A líder alemã controlou a sua fobia e permaneceu impassível na cadeira enquanto a cadela a farejava. Será sempre assim Putin, provocador e perturbador, procurando tirar vantagem das fraquezas do mundo.
2. Perturbantes têm sido também as reacções do PCP e do BE que teimam em defender um regime que é criminoso à luz do direito internacional. Se o Bloco nesta questão é intermitente, umas vezes critica outras desvaloriza, o PCP mantém a linha que o conduziu desde a sua fundação, defendendo Moscovo.
Custa-me ver gente que estimo e considero não se aperceber que a Rússia já não é o paraíso comunista na terra de Lenine e Estaline e nada tem a ver com a União Soviética. É um projecto de poder de um homem que alimenta e subsidia muitos partidos da extrema-direita europeia.
3. Não há nada de bom em nenhuma guerra, mas relevo que desde o ataque insano da Rússia nunca mais se falou de Covid nem das suas limitações, saíram de antena (e ainda bem) uma série de urubus patrocinados por farmacêuticas, mas também nunca mais se falou dos processos de corrupção que envolvem uma série de cavalheiros das elites medíocres e incultas que se arrastam há anos nos tribunais.
É importante manter a preocupação com o que se passa na Ucrânia, mas não nos devemos deixar narcotizar apenas com um tema nas agendas mediáticas.
O autor escreve de acordo com a antiga ortografia.