Nas últimas eleições, António Costa defendeu que Portugal necessitaria “de ter uma voz forte e afirmativa nas instituições europeias”, tendo proposto um plano económico que desafiaria Bruxelas. Os socialistas prometeram assim, que, caso o seu programa viesse a ser adoptado, a economia portuguesa iria crescer 2,4% em 2016 e 3,1% em 2017, no contexto de uma fortíssima aceleração do investimento. Já o défice fixar-se-ia em 3,0% do PIB no primeiro ano e em 2,5% no segundo, o que pressupunha uma consolidação orçamental muito mais suave do que aquela que o governo de PSD e CDS preconizava. O pilar da estratégia do PS assentava no “virar a página da austeridade” e na promoção de um crescimento económico mais rápido.

Porém, já no poder, os socialistas limitaram-se a alterar parte da composição da austeridade, não afrontando Bruxelas. É verdade que desagravaram impostos directos, só que por outro lado agravaram os indirectos, reduziram o investimento público e congelaram despesas correntes, com especial incidência na aquisição de bens e serviços. Por conseguinte, e também com o auxílio de medidas extraordinárias, em 2016 o défice acabou por ser de apenas 2,0%, mas a economia desiludiu e cresceu somente 1,4%. Para o ano, espera-se um défice de 1,0%, mas um crescimento económico de 1,8% – valores significativamente diferentes daqueles que foram apresentados em campanha eleitoral. O governo acabou, assim, por preferir uma consolidação mais acelerada, deixando o rápido crescimento para outra altura; o contrário do que havia sido prometido.

No entanto, desenganem-se aqueles que pensam que a maior surpresa desta história está no facto de os socialistas terem trocado a bandeira do crescimento da economia pelo estandarte do combate ao défice. O que verdadeiramente está a causar surpresa é a atitude do BE e do PCP. Ambos votaram favoravelmente os últimos dois orçamentos do Estado, o que significa, que tal como o PS, são os responsáveis pelas principais opções políticas tomadas pelo governo.

A realidade é que, para impedirem a direita de governar, bloquistas e comunistas colocaram-se nas mãos de António Costa que, por sua vez, os tem obrigado a aceitar a austeridade e a respeitar os tratados europeus; precisamente os mesmos que outrora prometeram combater. É esse o custo da gerigonça para o BE e o PCP: terem de satisfazer a contragosto as exigências de Costa e de Bruxelas, abdicando da sua identidade. Não há almoços grátis.

 

*O autor escreve de acordo com a antiga ortografia