A primeira declaração de estado de emergência já tinha colocado várias reservas e dúvidas sobre a sua efectiva necessidade, que se confirmaram como sendo absolutamente legítimas.
É normal que agora existam ainda mais dúvidas sobre a necessidade de voltar a fazer uso deste mecanismo. Torna-se cada vez mais claro que as medidas podem perfeitamente ser assumidas sem ser preciso recorrer a este mecanismo, que é um mecanismo extremo.
E a pergunta que se coloca é: qual o papel do estado de emergência no combate à pandemia? Por si só, a sua instituição não vem acrescentar qualquer contributo concreto.
A verdade é que a situação sanitária e a proliferação de casos exigem o reforço de algumas medidas, mas importa esclarecer que uma coisa são as medidas, e outra é o estado de emergência. Confundir estas dimensões não é sério, sendo aliás um erro que se deve contrariar, sobretudo se não queremos enganar as pessoas.
Aliás, as medidas mais importantes neste combate foram assumidas fora, e até antes, de qualquer estado de emergência, como foi o caso do encerramento das escolas e do confinamento voluntário dos cidadãos.
Ou seja, não é o estado de emergência que permite ao Governo dar as respostas necessárias, nomeadamente no que diz respeito ao fortalecimento do SNS, dotando-o dos meios humanos e materiais necessários para que continue absolutamente decisivo neste combate, mas também para que não deixe tudo o resto para trás, como está a suceder hoje.
Há uma necessidade absoluta de reforçar as respostas, que vêm tarde, e o Governo já devia ter agilizado os processos concursais, tanto para contratação de profissionais, como de aquisição de meios materiais. É preciso criar condições para que as pessoas possam respeitar as regras, nomeadamente nos transportes públicos e nas escolas. E é preciso explicar muito bem o que se vai fazendo e, para isso, também não precisamos do estado de emergência.
Não basta tomar medidas, é preciso explicá-las e apresentar as razões para serem aplicadas. Se as pessoas não compreendem os motivos e a utilidade das medidas, é mais difícil levá-las a sério e cumpri-las.
Há ainda outro aspecto a ter em conta. E quando o estado de emergência terminar ou não for renovado? Significa que já está tudo bem? Claro que não, mas, a partir daí, as pessoas tendem a interiorizar que já está tudo bem e fica a percepção que não é necessário levar as regras tão a sério, algo que não corresponde à realidade.
É preciso, por isso, tratar este assunto com clareza e honestidade, tendo presente que o estado de emergência é uma solução de fim de linha e que não deve desviar as atenções do essencial. Mais do que declarações de estados de emergência, o país precisa de medidas concretas e coerentes, que as pessoas percebam a sua utilidade e que permitam que a vida possa prosseguir com a normalidade possível nas circunstâncias que vivemos.
A autora escreve de acordo com a antiga ortografia.