Soube-se a semana passada que, de acordo com o Portal de Opinião Pública, o projecto conjunto da Fundação Francisco Manuel dos Santos e do Instituto de Ciências Sociais que reúne os dados de uma série de estudos de opinião em vários países europeus, o número de portugueses que confiam no seu governo é o mais alto dos países do Sul da Europa e o mais elevado no nosso país desde que o Eurobarómetro começou a medir esse indicador em 2003. Caso estes números traduzam efectivamente a realidade da opinião dos portugueses, tenho que reconhecer que será precisamente o contrário daquilo que eu esperava.

Quando, após as eleições de 2015, começou a tornar-se claro que o PS se preparava para procurar governar sozinho com o apoio parlamentar do PCP e do BE, escrevi que António Costa estava a ver mal o que lhe tinha acontecido. Parecia-me, primeiro, que Costa achava que não conseguira suplantar o PSD por os eleitores terem ainda receio do futuro que os aguardava e que por isso teriam preferido o “diabo que conheciam” à incógnita do PS e, segundo, que tendo supostamente perdido por não ser ainda governo, a forma de voltar a ganhar eleições era ser governo para que o efeito que lhe trouxera a derrota de 2015 lhe desse a vitória em 2019 (ou antes); mas, argumentei, essa era uma interpretação errada: o resultado eleitoral de 2015 era uma manifestação de uma crise da democracia portuguesa, em que à falta de confiança num governo não correspondia a confiança na alternativa, e que por isso, quem quer que fosse para o governo não teria, junto da opinião pública, a força para exercer o poder.

Pelos vistos, quem teve uma interpretação errada fui eu. Aparentemente, não dei o devido valor ao quão intenso era, para uma parte significativa dos portugueses, o cansaço da austeridade, nem a como um mero “governo placebo” que, mesmo não resolvendo qualquer problema sério do país, sinalizasse o “virar da página” da “austeridade” e que as coisas já não estão tão complicadas como estavam há uns anos atrás, lhes pareceria um abençoado alívio: desde Dezembro de 2015, a percentagem de cidadãos a confiarem no governo não parou de crescer, dos 15% de então aos 56% de hoje.

Mas embora reconheça o meu erro, não deixo de duvidar da solidez desta confiança. Afinal, o anterior “record” deste indicador tinha sido atingido em 2007, pelo governo do ex-primeiro ministro suspeito de corrupção, fraude fiscal e branqueamento de capitais José Sócrates, e três anos depois os 49% de 2007 já tinham descido para 19%. Embora o “comprimido de açúcar” de Costa pareça ter sido suficiente para aumentar a sua popularidade, tal como os de Sócrates o foram no seu tempo, não será de espantar que o seu efeito junto dos eleitores se desvaneça quando a conjuntura económica piorar e as dificuldades regressarem. E, para mal dos nossos pecados, o facto de as políticas de Costa não passarem de truques que deixam as (muitas) doenças da nossa sociedade agravarem-se enquanto as vamos ignorando é a garantia de que esse dia vai mesmo chegar. E aí, veremos em quem os portugueses depositarão a sua (pouca) confiança. Se o padrão das últimas décadas se mantiver, não será em ninguém que a mereça.