Muito já se escreveu sobre a proposta do Orçamento do Estado para 2022. No entanto, e ainda que fosse desejável que esta fosse mais arrojada no que respeita às medidas fiscais, várias das suas medidas podem ter um maior impacto no setor dos Produtos de Grande Consumo (Consumer Products & Retail, ou CPR).

Do lado dos consumidores, importa salientar que as expetativas económicas criadas com o previsível aumento do seu rendimento disponível (ainda que, na realidade, se trate de algo muito ténue) em virtude, quer do desdobramento dos escalões do IRS, quer do alargamento de 3 para 5 anos do designado “IRS Jovem” são suscetíveis de aumentar a propensão da população para o consumo, o que poderá favorecer a recuperação económica do sector.

Do lado das empresas, é de salientar o novo Incentivo Fiscal à Recuperação (IFR), o qual, pode dizer-se que é, de certa forma, uma continuidade do CFEI II.

A verdade é que, se o setor de CPR já enfrentava desafios e necessidades elevadas de investimento na otimização e melhoria dos canais de oferta, em tempos de pandemia, o setor viu-se mesmo forçado a acelerar o investimento na transformação digital pois o consumidor de hoje deseja poder escolher entre diferentes canais e ter experiências de elevada qualidade, qualquer que seja o canal que escolha, sendo que a tendência será para um crescente aumento do peso dos canais digitais. Ora, neste contexto, um benefício fiscal ao investimento é bem-vindo e poderá ser bem aproveitado por um setor que é normalmente excluído dos incentivos fiscais.
O IFR traduz-se numa dedução à coleta de IRC, e até à concorrência de 70% do respetivo valor, das despesas de investimento elegíveis em ativos afetos à exploração (até ao limite máximo acumulado de 5.000.000 euros), que sejam efetuadas no 1º semestre de 2022, sendo a dedução efetuada de acordo com regras específicas. A aplicação deste crédito fiscal tem alguns condicionalismos. Em todo o caso, o CFEI II também já dispunha de algumas restrições e as mesmas não impediram o setor de aderir ao benefício.

A proposta de Orçamento prevê ainda a eliminação em definitivo do PEC, o que, constituindo uma medida com pouco impacto prático, não deixará de beneficiar os players do setor, sobretudo os de menor dimensão.
Estão ainda previstas algumas medidas que haviam sido introduzidas aquando da pandemia. Veja-se o alargamento dos prazos gerais de submissão das declarações periódicas e de pagamento do IVA e a possibilidade de adesão a planos prestacionais para pagamento do IVA e retenções na fonte de IRS e IRC no 1º semestre de 2022. Mais uma vez, este alívio de tesouraria poderá ser aproveitado pelos players de menor dimensão e permitir algum alívio que sempre beneficia o consumo. Nada é referido, porém, relativamente à aceitação das faturas em “pdf”, como se de faturas eletrónicas se tratassem, substituindo-se assim também as originais em papel. Note-se que esta medida, tem particular impacto num setor em que as faturas e documentos equivalentes referentes às transações atingem um grande volume. A aceitação das faturas em “pdf” tem sido consecutivamente prorrogada e encontra-se em vigor até 31.12.2021. De facto, ainda que um “pdf” não seja como uma fatura eletrónica, a sua aceitação permite facilitar o envio de documentos, sendo que a AT, através do SAFT, tem mecanismos próprios para controlar a veracidade das transações em causa.
Será que esta medida causou perda de receita fiscal? Ao que sabemos, foi uma medida de simplificação que auxiliou em muito a economia e por inerência o sector de CPR. Não seria assim altura de rever a possibilidade de tornar definitiva a aceitação dos “pdf’s” para efeitos fiscais? Também nesta área se pede um pouco mais de arrojo e medidas simplificadoras.