O prolongamento da guerra na Ucrânia torna o debate sobre a paz cada vez mais complexo e, simultaneamente, mais premente. O que poderia ter sido uma solução aceitável para ambas as partes, nas semanas imediatamente após o dia 24 de fevereiro de 2022, com a Ucrânia a manter a sua independência e integridade territorial, amputada apenas da Crimeia, torna-se hoje extremamente difícil.
É cada vez mais claro, que os avanços territoriais russos no Sul do país, em particular na zona que confina com a Crimeia, conduzirão à integração desses territórios na Federação Russa ou numa das Repúblicas separatistas. Isto teria sido desnecessário, se os dirigentes ucranianos não estivessem convencidos, como ainda estão, de que conseguiriam derrotar militarmente a Rússia. Qualquer solução que se venha agora a obter será mais desfavorável para a Ucrânia, do que aquela que teria obtido antes ou imediatamente após o início das hostilidades.
Nas conversações em Minsk e em Ancara, a parte russa não fez reivindicações territoriais (não significa que não as tivesse em mente). Moscovo pretendia a retirada das forças ucranianas da região do Donbass, que se preparavam para atacar as repúblicas separatistas.
Vai sair cara aos líderes ucranianos a teimosia em continuarem a acreditar na vitória militar sobre a Rússia, sobretudo quando Washington se começa a afastar de Kiev, acusando os ucranianos de não lhe ter dado ouvidos, e de lhe ter sonegado informação operacional. Aplica-se o mesmo à crença de que o equipamento proveniente da ajuda internacional funcionará como a fada mágica que irá inverter o rumo dos acontecimentos no terreno.
Com as midterm à porta, a inflação a subir (a mais alta dos últimos 40 anos), os julgamentos do 6 de janeiro, e Wall Street a atingir o bear market, o Exército ucraniano a baquear e a derrota militar a pairar no horizonte, o objetivo inicial de Washington de derrotar militarmente Moscovo, deu lugar ao seu enfraquecimento, para se falar agora de uma solução diplomática, mas sem os EUA se comprometerem com uma em particular, deixando essa espinhosa tarefa para os ucranianos, nomeadamente no que respeita às disputas territoriais.
Segundo o Presidente Biden, num artigo publicado no “New York Times”, “a guerra só terminará definitivamente por meio da diplomacia. A negociação refletirá os factos no terreno”. O equipamento militar a enviar para a Ucrânia visava dar-lhe condições para “lutar no campo de batalha e estar na posição mais forte possível à mesa das negociações”.
Com o distanciamento do seu patrocinador, Kiev devia pensar seriamente na situação em que se encontra. Washington deixou claro a Zelensky que ele tem de explicar aos ucranianos que há limites para a ajuda internacional. Seria importante que desse ouvidos a Macron, Scholtz e Draghi na visita que estes farão brevemente a Kiev, e percebesse a sua reduzida margem de manobra para negociar.
Como as guerras não se ganham nas redes sociais, mas nas frentes de batalha, a liderança ucraniana terá, mais tarde ou mais cedo, de lidar com esta dura realidade. Quanto mais tarde, mais desfavorável lhe será o resultado. Como os afegãos, também Zelensky corre o risco de entender tardiamente que o “argumento moral é insuficiente para explicar as duras realidades da geopolítica.”