“O tempo chega sempre; mas há casos em que não chega a tempo” – Camilo Castelo Branco

Também o tempo sofre de potenciais ausências, quando o cérebro humano fabrica e armazena, regularmente, lapsos de tempo. E apercebemo-nos dos mesmos quando recorremos à memória e, nela, aquilo que conseguimos operar e recuperar, ou revisitar. “Ausência, ouve o meu protesto contra a tua força, distância e extensão. Faz o que podes para a alteração, para os verdadeiros corajosos. A ausência aquieta e o tempo determina” (John Donne). Um dia falava com o escritor Gonçalo M. Tavares, que me dizia que “o erro no tempo contagia a qualidade da decisão”. Ora tomar decisões por impulso tem, habitualmente, um desfecho indesejável.

Para mim, cada um/a de nós não é somente aquilo que come, aquilo que cogita e aquilo que sente. É, igualmente, a sua relação com o tempo e com tempo, porque ele “é a única coisa que temos verdadeiramente nossa” (B. Gracián y Morales). O tempo também merece respeito, que não apenas os seres. Muitas pessoas só reparam no tempo quando deixam de o ter. Entretanto, o tempo vai sumindo. Foi feito para ser andado, não parado, muito menos desperdiçado ou manietado! Daí o conselho de Sófocles: “não procures esconder nada; o tempo vês, escuta e revela tudo”. O tempo de cada um/a só será aproveitado mediante o valor que se lhe dá, no calor afetuoso com os outros. Esse tempo não pode ser adiado ou ignorado!

Como escreveu Phil Bosmans, “os tempos apenas são maus se também os homens forem maus. Os bons tempos não caem do céu. Nós é que os fazemos, não com técnicas ou dinheiro, mas com bondade e amor”. Contradizendo, assim, a ideia proliferada “aos sete ventos” de que “tempo é dinheiro”, expressão que – como fundamentado – o autor considera: “talvez, a mentira maior do século XX”.

Outros ditados, indeterminadamente sem sentido nem ratificados à atualidade (dizemo-los, por vezes, sem pensar), são: “dar tempo ao tempo” – quando tempo não faltou ou falta, para tantos de nós, aquando da larga quarentena em confinamento; “devagar se vai ao longe” e “mais vale tarde do que nunca”… Como apontou Miguel Esteves Cardoso, no passado, “o tempo que se deu ao Tempo ao longo destes 800 anos já deverá ir, segundo os nossos cálculos, em mais de 5000 anos”.

O tempo não espera por alguém ou será que sim? E estamos, nós, à espera de ter tempo? Exigimos ter mais tempo quando não o temos: o tempo permanece o mesmo. Logo, “escolher o seu tempo é ganhar tempo” (F. Bacon). Não importa quanto tempo temos ou tivemos, o que importa é o que fazemos dele! E não deixar que ele “se areie entre os dedos” (Mia Couto). O tempo da vida faz-se no presente, olhando sempre para o futuro e não para o passado. Porque, como continua o escritor moçambicano, “tornado invisível, o passado deixa de doer”.

Atentem-se, ainda, outras suas citações acutilantes: “Não precisamos de mais tempo. Precisamos de um tempo que seja nosso”, aludindo a esta velocidade estonteante com que vis comentários se desferem e com que as situações se sucedem. Bem como, “o bom do caminho é haver volta. Para ida sem vinda basta o tempo”.

É preciso que a vida volte ao que deve ser a sensata normalidade – pois vive-se muita banalidade, brutalidade, fugacidade e outras ‘idades’ que envelhecem o tempo –, com tempo para o que é imprescindível, indiscutível e plausível. Como li num filme, “só o tempo pode ensinar-nos o que é a verdade e o que é lenda. Algumas verdades não sobrevivem aos tempos”. E que os ponteiros da nossa vida sejam o trio seguinte de valiosas lições, entre outras, alusivas ao próprio tempo: ser pontual, recomeçar é sempre possível e não brincar com o tempo.

De forma poeticamente extraordinária, exprimia Khalil Gibran: “– Gostaríeis de medir o tempo, o infinito e o incomensurável. (…) Contudo, o atemporal que há em vós tem consciência da atemporalidade da vida; e sabe que o hoje é só memória do dia de ontem e que o amanhã é sonho de hoje. (…) E não é o tempo, como o amor, indivisível e imóvel?”. Olhando para a História mundial, que tempo somos nós? Que tempo queremos e/ou que queremos do tempo?

Victor Hugo dizia que “os tempos primitivos são líricos, os tempos antigos são épicos, os tempos modernos são dramáticos”. Optemos por tempos ativos, contemplativos e produtivos, ao invés de tempos cativos, depreciativos e adstritivos. Que o tempo seja sempre, na luz, de não desaparecer nem desfalecer, pois a escuridão do anoitecer demora mais que o amanhecer!