A semana fica marcada pela apresentação da “Carta para a Celeridade e Melhor Justiça”, um conjunto de propostas do Conselho Superior da Magistratura (CSM) para tornar a justiça mais rápida. Mas rapidamente nos questionamos: é possível discutir uma justiça “mais célere” e “melhor” sem a participação dos Advogados? Analisando as propostas, a resposta é evidente: não.
No entanto, o que emerge deste documento é uma insistente preocupação em punir alegadas “manobras dilatórias” – um rótulo muitas vezes atribuído ao legítimo exercício do direito de defesa. Entre as medidas sugeridas, destacam-se multas por atos considerados “manifestamente infundados” e até a possibilidade de processos disciplinares contra Advogados, a serem instaurados pela própria Ordem.
A mensagem subliminar é clara: os Advogados passaram a ser vistos como um entrave à celeridade da justiça. Como se não bastasse a crescente inversão do processo penal, onde se perseguem Advogados para investigar os seus clientes, colocando em causa pilares essenciais da profissão – como o sigilo profissional e a independência –, agora propõe-se que sejamos penalizados simplesmente por defender quem tem direito a ser defendido.
E isto surge num momento em que a Ordem dos Advogados perde progressivamente a sua autonomia disciplinar, passando os seus órgãos a integrar “não Advogados”, com um Conselho de Supervisão que, sob pretexto de “zelar” pela legalidade, poderá minar a essência da Advocacia.
Mais preocupante ainda é a agenda subjacente a estas propostas: uma redução generalizada das garantias processuais dos cidadãos. Desde a limitação do direito ao recurso até à erosão de direitos fundamentais, assiste-se a uma tentativa de transformar a justiça num sistema eficiente para o Estado, mas não para o cidadão. Como se a justiça, já cara e morosa, pudesse agora ser tornada “célere” à custa do enfraquecimento da defesa e do sacrifício dos direitos, liberdades e garantias.
Não nos enganemos. Há muito que se instalou uma visão burocrática e tecnocrata da Advocacia, que reduz o Advogado a um mero cumpridor de prazos, quando, na verdade, ele é o pilar essencial da Justiça e do Estado de Direito.
O mais alarmante? O silêncio da Ordem dos Advogados. A instituição que deveria ser a primeira linha de defesa dos Advogados perdeu-se em comentários supérfluos, deixando de ser um farol da Justiça para se tornar um reflexo da espuma dos dias. Hoje, fala-se de tudo e, por isso, de nada.
É urgente inverter este caminho. Reafirmar a Advocacia como instituição central do Estado de Direito. Defender, sem hesitação, o papel dos Advogados na garantia das liberdades fundamentais.
Mais do que nunca, é tempo de uma nova voz. Uma voz que recoloque a Ordem dos Advogados no seu lugar: a primeira defensora da “Defesa da Defesa”.