Quem pretende liderar deve estar disposto a servir a comunidade e dar o exemplo, recusando privilégios injustificados.
Aquilo a que estamos a assistir no processo de vacinação contra a Covid-19 é uma dessas situações em que se exige a quem pretende liderar que esteja disposto a dar o exemplo. Com exceção do Presidente da República, do primeiro-ministro e de elementos chave do Governo, cuja eventual infeção por Covid-19 poderia colocar em causa a estabilidade política e ameaçar o superior interesse nacional, não se justifica que os 230 deputados, autarcas e algumas centenas de outros titulares de cargos públicos sejam vacinados antes dos médicos e enfermeiros que estão na linha da frente de combate à pandemia.
Trata-se de uma decisão injusta e errada do ponto de vista dos princípios, que além disso poderá minar a confiança dos cidadãos nas instituições.
Dizer isto não é populismo, mas sim realismo. Uma liderança sem autoridade moral não consegue ser eficaz, muito menos numa situação de emergência nacional. A tradição do capitão ser o último a abandonar o navio tem a sua razão de ser. Se os portugueses ficarem com a ideia de que estamos numa situação de ‘salve-se quem puder’ e que os políticos são os primeiros a pôr-se a salvo – passando à frente daquelas pessoas que realmente arriscam diariamente a vida por todos nós – será ainda mais difícil mobilizar e unir o país para conseguir fazer frente a esta crise.
Os políticos que, de forma injustificada, receberem a vacina poderão ficar imunizados contra a Covid-19, mas não ficarão a salvo da desconsideração popular. Da próxima vez que nos pedirem sacrifícios, será difícil não recordar que fizeram questão de ser vacinados antes dos médicos, dos enfermeiros e dos idosos. Quem precisa de líderes destes?