O que faz um comediante ganhar eleições num país europeu, contra um candidato incumbente e por uma margem impensável, 73% dos votos? Esta pergunta nada tem de novo. Outras figuras da TV conseguiram bons resultados em eleições sem terem uma carreira política a suportá-los, como Beppe Grillo em Itália ou até, porque não dizê-lo, Donald Trump.

Uma coisa é comum a todos: o desencanto com o statu quo e quem o personifica, e a inexistência de uma alternativa gerada pelo “sistema”. Mas é preocupante a forma como hoje os eleitores podem ser influenciados – ou mesmo manipulados – numa campanha. A interferência russa nas eleições americanas e no referendo britânico, as fake news, a Cambridge Analytica são a ponta visível de um icebergue que na Ucrânia foi mais claro pelo apoio de Kolomoisky, o patrão de Zelensky na cadeia de TV que passa o “Criado do Povo” (o programa de TV onde Zelensky faz de Presidente) e que promoveu a sua candidatura.

Vender presidentes ainda é, pelos vistos, como vender sabonetes, e Zelensky é mais limpo e bem cheiroso que Poroshenko, pois ganhou com uma campanha onde não disse praticamente nada sobre praticamente tudo. Ou seja, Zelensky não ganhou, foi Poroshenko que perdeu.

O poder da comunicação é bem visível nestes dias. López Obrador – AMLO – ganhou as eleições no México e dá conferências de imprensa todas as manhãs dos dias de semana, nas quais cada jornalista pode fazer duas perguntas. Trump “posta” tweets à velocidade da luz, sobre todos os acontecimentos e todo o tipo de assuntos, como levar o dilúvio à Notre-Dame. Salvini faz selfies com os apoiantes, que o tratam por “capitano”, e divulga-as nas redes sociais para mostrar uma familiaridade e proximidade que lhe granjeiem simpatia; candidata-se a líder do novo grupo político no Parlamento Europeu, uma união contranatura para quem proclama “a Itália primeiro”.

Comenta o “Le Monde” de dia 20 que o movimento dos coletes amarelos sobrevive graças a duas alavancas, a mediatização e o sentimento de injustiça, sendo que o último é potenciado pela primeira.

A esta velocidade, a realidade fica efémera e os protagonistas são como as alfaces do Lidl. A tirania do curto prazo instala-se. O desafio para os Zelenskys deste mundo passa a ser não ganhar, mas sim renovar a vitória, numa prática que mistura habilidade, manipulação e sorte. Não é fácil. A situação no Reino Unido com o Brexit mostra os limites do populismo e nacionalismo. Há sinais recentes encorajadores, como a subida a segundo partido por intenções de voto dos verdes na Alemanha, deixando para trás a Afd, ajudados pela redução da imigração ilegal; e a vitória de Caputová na Eslováquia, batendo os populistas. Mas populistas e demagogos nada têm a perder, só podem perder os outros. Todos.