Passadas quase três décadas da assinatura do Tratado de Maastricht que abriu as portas à moeda única e o caminho para a criação de uma união política da Europa, leia-se, Europa federal, vale a pena fazer um ponto de situação.
O processo da federalização europeia é um processo original. Enquanto que a criação de Estados Federais foram processos top down (o caso dos Estados Unidos envolveu uma guerra civil dolorosa e cruel como, aliás, são todas as guerras civis), o caso europeu é único, funcionando bottom up, partindo do económico para o político. Sendo uma experiência única, deveria merecer um tratamento particularmente cauteloso.
A nova Alemanha (unificada) impôs aos seus parceiros europeus uma moeda única concebida à semelhança do Marco, que lhe veio proporcionar enormes vantagens. A Alemanha ditou ainda aos seus parceiros o alargamento para o Leste europeu, região de interesse crucial para a sua expansão económica (e não só). A reboque dos interesses alemães, foram incorporados na Comunidade Europeia países que não reuniam condições políticas ou económicas para tal. Os resultados nefastos dessas decisões estão à vista de todos. Uma vez mais, prevaleceram os imperativos estratégicos, o que levou a um indesejável strategic overstrech da Comunidade.
Não tirando as devidas ilações destes erros, a União prepara-se para incorporar novos países com problemas internos não resolvidos, e assim importar os seus problemas. Interessante sublinhar que estes casos vieram mostrar as limitações das teorias das relações internacionais liberais institucionalistas no que respeita à adoção na ordem política interna das regras e normas prevalecentes nas organizações internacionais que integram.
O reforço da centralização do poder e a marginalização dos pequenos Estados (19 Estados-membros têm dez milhões de habitantes ou menos) de decisões importantes foram consequências da nova correlação de forças que emergiu após Maastricht em que a Alemanha foi a grande ganhadora. Estas relações de soma nula criaram frustrações e ressentimentos nos pequenos Estados devidamente exploradas por forças nacionalistas que vão surgindo aqui e acolá, e contribuíram decisivamente para a implosão do centro político que se tem vindo a verificar.
Ao deficit democrático, à centralização do poder, à falta de solidariedade manifestada durante a recente crise económica veio juntar-se recentemente o Brexit e o problema da emigração ilegal para o qual a União não consegue apresentar soluções razoáveis.
É bom consciencializarmo-nos que a União Europeia se encontra num ciclo de desagregação. Há que perceber, uma vez por todas, que este modelo de construção europeia não vai vingar e tem de ser repensado. A construção da Europa não vai ser feita por uma vanguarda esclarecida à revelia dos seus povos. Apesar de todas as contrariedades conhecidas, à semelhança da orquestra do Titanic, tem-se procurado “avançar a todo o vapor” (para a União Política), recuperando uma expressão muito querida da juventude de um antigo presidente da Comissão.
É mais do que tempo para se repensar o projeto europeu noutros termos. O atual modelo está condenado ao fracasso. É apenas uma questão de tempo. Só faltava ser acelerado pela vitória da “Frente Nacional” nas próximas eleições em França.