Finalmente, Diébédó Francis Kéré vence o prémio Pritzker! Eis a frase que muitos arquitetos exclamaram na passada semana.
O prémio, denominado Nobel da Arquitetura, foi criado em 1979 para homenagear, anualmente, arquitetos vivos, “cujo percurso demonstra uma combinação de qualidades, visão e compromisso, produzindo contribuições consistentes e significativas para a humanidade“.
A homenagem à Arquitetura de Kéré é marcante não só pelo vasto conjunto de obras inspiradoras, como a generalidade dos premiados anteriores, mas também por dar voz a uma arquitetura sensível à cultura local para proporcionar justiça social, ambiental e empoderamento da comunidade.
O júri do Pritzker reconhece, assim, que a “Arquitectura não tem a ver com o objecto mas sim com o objectivo; não com o produto, mas com o processo”, sublinhando a necessidade de expandir o papel do Arquitecto como mediador de estratégias de intervenção e de aproximação à comunidade.
O júri enuncia várias questões que são fundamentais para uma reflexão mais alargada sobre o cerne da Arquitetura do futuro, especialmente quando estamos a passar por crises económicas, sanitárias e, agora, uma guerra. Estamos interligados e as preocupações com a democracia e a escassez são preocupações para todos nós:
“Qual é o papel da Arquitectura em contextos de extrema escassez? Qual é a abordagem correcta da prática quando se trabalha contra todas as probabilidades? Deve ser modesta e arriscar-se a sucumbir a circunstâncias adversas? Ou será a modéstia a única forma de ser pertinente e alcançar resultados? Deverá ser ambiciosa para inspirar a mudança? Ou a ambição corre o risco de estar fora do lugar e de resultar numa Arquitectura de mero desejo?”
As respostas a estas questões têm sido ensaiadas em modelos alternativos, através da necessidade de um novo compromisso social, preconizados desde os anos 60 e 70 do século passado. No entanto, acabou por ser a crise mundial de 2008 que reposicionou o papel do arquiteto em contextos de escassez. Na exposição “Small Scale, Big Changes”, no MoMA, em Nova Iorque, é possível ver, em retrospetiva, as notáveis práticas de engajamento social num esforço de redefinição da atividade do arquiteto.
Ser radicalmente simples é para Kéré a solução para compreender as necessidades de uma dada comunidade antes de projetar um edifício, bem como compreender quais os materiais e técnicas de construção viáveis numa dada região. Aquele mostra-nos o poder da materialidade enraizada no lugar. O Projeto Gando no Burkina Faso, sua terra natal, que evoluiu passo a passo a partir do projeto de uma Escola Primária, é um exemplo paradigmático do seu pensamento.
Em Portugal, o interesse genuíno pelos processos participativos de projeto e construção em arquitetura para responder aos problemas mais prementes das populações mais desfavorecidas verifica-se na transformação geracional. Pedro Clarke e Miguel Mendes são dois exemplos da responsabilidade da arquitetura nacional para 90% da população mundial.
Termino sublinhando as palavras de Kéré: “tenho esperança de mudar o paradigma, de levar as pessoas a sonhar e a correr riscos”.